Um espaço de convívio entre amigos, que acabou por se tornar um arquivo protegido por um só curador.

Tag: Educação

A vida como ela é… Na Espanha do PP.

Pra quem acompanha o blog há pouco tempo, eu estou fazendo doutorado em Direitos Humanos na Espanha, junto com Thiago Loureiro, desde 2009, pois bem…

Em 2009, quando chegamos aqui, existia um governo “socialista”, o governo do Partido Socialista Obreiro Espanhol (PSOE), a Espanha já estava em crise, não obstante, os serviços públicos, tinham fama de bons, tanto a escola pública, como o sistema público de saúde, e etc. Além disso, tinha-se um governo progressista, um dos primeiros na Europa a liberar o casamento civil homossexual, estava permitido o aborto, e a discussão em questão era se meninas de dezesseis anos poderiam ou não abortar sem consentimento dos pais, acredito que fizeram poucas mudanças no ensino, e aqui falo com um desconhecimento de causa gigantesco.

Mas uma dessas mudanças foi a nova matéria escolar Educación para la ciudadanía y los derechos humanos“, cujo nome fala por si, mas que versava sobre alguns conteúdos controversos, como educação sexual, tolerância de credo, sob uma perspectiva laicista, famílias monoparentais, e famílias homossexuais. Enfim, sob minha ótica, seria uma disciplina que tinha um bom conteúdo e estava bastante bem. Seria algo bastante parecido a algo que se queria fazer no Brasil, e que foi negado por alguns… Mas não é hora de entrar nesse assunto…

Pois bem, agora em 2012 retorno, agora com a Espanha sob o governo do Partido Popular (PP), e aqui se faz necessária a explicação das aspas no socialista do começo do texto. Em qualquer lugar, qualquer pessoa que acompanhasse a política daqui, diria que seria a mesma coisa um governo de esquerda e um de direita. Eu estava entre esses, e estava entre eles porque dizia-se que as medidas econômicas tomadas pelo governo de esquerda, do PSOE, eram as mesmas que o PP, partido de direita, adotaria. Se dizia então que tanto faria o governo, se o governante continuaria arrochando o povo, e por consequência, a classe média. Logo, o governo seria socialista, entre aspas.

Agora mesmo, faz muito pouco tempo que teve início o governo do PP, que aqui na Espanha foi votado, porém, não fariam falta os votos, já que Mariano Rajoy governaria de qualquer modo, por ser o escolhido do Banco Central Europeu, e para quem duvidar, basta abrir os olhos e observar o golpe de Estado dado na Itália.

Pois, primeira medida educativa, tirar a matéria Educação para a Cidadânia e Direitos Humanos, e substituir por outra, “Educación Cívica Constitucional”, que estaria livre de conteúdos controversos, e não “doutrinaria” “as crianças”.

Aqui a educação básica (Educación Secundaria Obligatoria – ESO – nosso ensino fundamental), é até os dezesseis anos, e o equivalente ao nosso ensino médio, o bachillerato, tem dois anos. No entanto, há um deficit de gente formada na educação fundamental, o PP resolveu o problema da seguinte forma, diminuiu-se um ano de ensino fundamental, e aumentou-se um ano de ensino médio, como a educação obrigatória é até os 16 anos, então as pessoas que não aprovavam no último ano de estudo, e depois paravam de estudar, agora vão ter obrigatoriamente de estar no mínimo mais um ano no colégio, e talvez até, fazendo uma coisa que não querem (já que ao acabar o fundamental, aqui, há vários cursos técnicos, inclusive superiores, e várias pessoas optavam por eles, que não podem ser feitos ao mesmo tempo em se faz o ensino médio), logo sem investir um centavo, vão aumentar o número de aprovados no ensino fundamental, me arrisco a dizer que vai virar estatística, e consequentemente propaganda de governo.

Bom, todo esse floreio sobre a tal disciplina escolar, é apenas mote, para as medidas mais perversas, eu falei antes que não investiram um centavo, na verdade, cortaram verba, e diminuiu-se o numero de professores, e os forçam a assumir disciplinas diversas, assim há (num exemplo esdruxulo, mas não sei até onde) professores de matemática, ensinando português e matemática, com um salário já mais baixo do que quando o governo começou, e escolas sem dinheiro suficiente para pagar a calefação durante todo o inverno, há cidadezinhas, onde os alunos vão as aulas com mantas, para se cobrir durante as aulas, alguém acha que dá pra prestar atenção e fazer anotações numa aula, a zero grau, mais ou menos, onde você tem que estar enrolado num cobertor?

Há, só mais uma coisa…

Para mudar um pouco da educação, vem a notícia quase absurda: todos os casamentos homossexuais realizados, estão em vias de ser anulados, e a lei que os permitia, em vias de ser revogada pelo tribunal constitucional, o equivalente ao nosso STF.

Esse é o governo de direita na Espanha, do PP, e a saúde pública… Bom, a saúde pública fica pra outro post…

 

O Brasil não é um país sério. Vale tudo para tornar educação simples mercadoria.

Senado da República prestes a aprovar a absurda – mas, muito absurda mesmo – dispensa dos graus de mestre e doutor para professores universitários de instituições públicas e privadas.

Cria a figura hedionda do contrato de trabalho docente temporário. Sucumbe às pressões dos milionários donos de universidades privadas, ávidos por baratearem seus custos e maximizarem seus lucros, ainda que em detrimento do nível dos docentes.

Tal absurdo interessa só aos empresários do ensino superior, que é um tremendo negócio, diga-se. Aumenta exponencialmente a oferta de trabalhadores precários, recém saídos da graduação, e vai em sentido contrário à elevação de nível e de profissionalismo que se vinha buscando de algum tempo para cá.

Na verdade, a docência devia ser toda submetida ao regime da dedicação exclusiva e ser bem remunerada por isso. As alterações legislativas prestes a serem aprovadas no Senado vão rigorosamente no sentido inverso. Ou seja, no de tornar a docência um trabalho precário e o professor escravo de várias faculdades particulares, mal-pago em todas.

Os interesses dos donos de faculdades privadas não se confundem com os interesses do país. Por isso mesmo, é aviltante que o Senado da República deixe-se capturar por interesses parciais em detrimento do interesse público. Depois, os políticos ainda ensaiam achar ruim serem considerados a classe menos respeitável que há.

Seria uma grande oportunidade para a Presidente Dilma exercer seu poder de veto de lei!

 

Brasil: as raízes da deformação social – Atualizado.

O Programa Internacional de Avaliação de Alunos – Pisa divulgou os resultados das avaliações de 65 países. O Brasil ficou na 53º posição, ou seja, muito próximo das últimas. Ainda que tenha melhorado em relação a 2006, a situação é terrível. Como disse a Economist, a situação brasileira evoluiu de desastrosa para muito ruim.

Há dois dados que merecem olhar atento e menções cuidadosas e sem eufemismos, por isso transcrevo adiante passagens da matéria da revista, citada na BBC em português:

Mesmo escolas privadas e pagas são medíocres. Seus pupilos vêm das casas mais ricas, mas eles se tornam jovens de 15 anos que não se saem melhor que um adolescente médio da OCDE”

“Apesar do avanço, a revista diz que dois terços dos jovens de 15 anos são incapazes de fazer qualquer coisa além de aritmética básica.”

A primeira conclusão é que a falta de educação é bastante democrática e permeia todas as classes sociais, embora as mais altas não o aceitem.

A segunda conclusão é que o nível de escolaridade médio é obscenamente baixo. A enorme maioria das pessoas não é capaz de compreender um texto, qualquer que seja ele, nem de expressar-se por escrito, ainda que em um bilhete.

E expressa-se oralmente por uma linguagem repleta de termos ambíguos, repetidos e plurisignificantes. Claro que sempre haverá um e outro linguista a chamar essa imprecisão de riqueza da oralidade. Mas, isso é o germe da pobreza e da aceitação da dominação, sem percebê-la.

Nesse ambiente, os que dominam razoavelmente algumas ferramentas lógicas, ou seja, sabem construir um período minimamente coerente, têm aberto o caminho da pequena sofística e obtém as migalhas que bastam-lhes para serem 10% da população.

O incremento da concentração de rendimentos permite que as camadas médias permaneçam mais ou menos onde se encontram, na escala social, com menos competências. Isso porque as vastas camadas baixas e baixíssimas não possuem, de regra, educação alguma. É aquilo que vulgarmente enuncia-se naquele dito genial: em terra de cego, quem tem um olho é rei.

É interessante que a revista Economist não consegue escapar da prisão das suas condicionantes ideológicas. Ela diz que o problema é de dinheiro. Ela tem que referir tudo a dinheiro, é claro, mas incorre em uma contradição. Se a publicação diz que o nível das escolas privadas e públicas é muito semelhante e se sabe que as primeiras são caríssimas, devia perceber que a associação está errada.

Gasta-se muito dinheiro em educação privada no Brasil e, nada obstante, ela é péssima. Evidentemente que mais dinheiro ainda poderia significar um incremento marginal de qualidade, mas a falta dele não é a causa principal dessa comédia de horrores.

O ponto central é o pacto pela mediocridade. Esse acordo é daqueles que se pactuam com Satanás de fiador e os contratantes acham imensas vantagens nele. Dá-se algo como o sujeito que está feliz por pagar juros de 10% porque algum vizinho está a pagar 11%. Apenas o fulano desconhece que há quem pague 09%.

O pacto pela mediocridade funciona assim: um pequeníssimo grupo chama outro menos pequeno e garante-lhe que não se deve preocupar com bobagens de livros, investigações e coisas do gênero, porque eles estão a engendrar um mundo maravilhoso de abundância, que será obtida por duas razões, a primeira mágica, a segunda o trabalho de um terceiro grupo.

O segundo grupo – o menos pequeno – acha a idéia sedutora, mas antevê por entre algumas sombras que ainda falta algo para fechar a conta. Claro, diz o grupo mais pequeno, mas pensamos nisso também. O pacto vai ser firmado com o terceiro grupo também!

O grupo intermédio, sincero nas suas desconfianças, objeta timidamente que talvez o terceiro grupo não queira aderir. Mas, a verdade descortina-se a uma revelação do primeiro grupo: ora, o terceiro grupo é incapaz de expressar sua vontade, precisa ser tutelado. Fiat lux!

Firmamos por ele, que precisa ser tutelado e afinal não compreende coisa alguma do extenso contrato.

Permito-me inserir, aqui na postagem, o comentário de Rafael, porque corrige informações que retirei da Economist por meio da citação da BBC. Porque traz informações precisas e porque traz uma boa análise. Segue o comentário do Rafael:

As performances das escolas privadas e das públicas não são semelhantes. A nota média das escolas privadas brasileiras no teste da PISA foi de 519. A das públicas foi de 398. Há um gap na qualidade delas, e ele é enorme. A distância entre um estudante de escola privada brasileira e um de escola pública é semelhante àquela entre um estudante britânico e um colombiano. Em média, aliás, a nota do estudante de escola privada brasileira supera a de um estudante americano médio (497), e também a de um estudante britânico médio (502) ou a de um estudante médio de um país médio da OCDE (497). Nem por isso a The Economist chamará de medícores as escolas de seu país, do Reino Unido. Mas com países da América Latina, usa-se muito nos textos dessa revista de adjetivos vazios como sucedâneo de uma análise dos fatos. Essa revista, aliás, se notabiliza por sempre tentar interpretar a realidade dos fatos e prever tendências futuras com um número muito reduzido de conceitos, todos eles invariavelmente extraídos de uma visão de mundo liberal. Que a The Economist prevê como fadada à ineficiência qualquer tentativa de melhorar a qualidade do ensino público através do aumento de gastos no setor, é prova disso. O argumento dela nesse sentido – um argumento, aliás, muito tosco e simplista – é o de que os gastos relativos ao PIB do Brasil nesse setor já são maiores que a média dos gastos dos países membros da OCDE. Em vez disso, a The Economist recomenda como exemplar a estratégia adotada pelo governo São Paulo – um estado que, apesar de rico, fornece uma educação pública muito ruim, até abaixo daquela da média brasileira, algo que a maioria dos brasileiros que lêem jornal já devem saber bem.

Agora que temos dinheiro, podemos ter educação e algo mais?

Duas figuras interessantes, primeiro, o famoso PIB, Produto Interno Bruto…

Gráfico do PIB

PIB

Segundo o jornal espanhol ABC, diz o FMI que em 2014, o PIB brasileiro será o 8º do mundo… Traduzindo, estaremos atrás apenas de: EUA, China, Japão, Alemanha, França, Reino Unido e Itália. Mesmo hoje em dia, não estamos tão mal… Além desses já citados, apenas há a mais, Rússia e Espanha (A reportagem do ABC.es é pra dizer que a Espanha vai descer algumas posições).

Agora outro gráfico, com um troço chamado Paridade do poder de compra:

Paridade do poder de compra

Paridade do poder de compra

Essa tal Paridade do poder de compra é um índice que relaciona o poder aquisitivo das pessoas com o custo de vida do local onde ela mora, se ela efetivamente consegue comprar tudo que necessita com seu salário. Já dá pra enxergar o tanto de análises que se podem fazer observando os dois gráficos?

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