Um espaço de convívio entre amigos, que acabou por se tornar um arquivo protegido por um só curador.

Categoria: Um texto (Page 8 of 10)

Argentina: futebol ofensivo e talentoso não morreu.

Higuaín.

Que sigam os adeptos do Deus Itália seu rumo. Mas, não decretem precocemente a morte do futebol ofensivo, baseado no talento, no toque de bola, na velocidade. Tampouco lancem mão desse lugar-comum terrível da relação necessária entre tática ofensiva e fragilidade defensiva.

A Argentina venceu a Coréia do Sul por 4 gols a 1 e podia ter marcado mais. Com relação à primeira partida, a equipe argentina evoluiu. Pareceu-me menos dependente de Messi, na medida em que, hoje, Di Maria e Tevez deram grandes apresentações.

Se vão ser os grandes vencedores, ou não, pouco me importa. Espero que sigam até as finais, porque oferecerá bons espetáculos.

Saúde e educação públicas, no Brasil. É necessário envolver as classes médias.

Na democracia representativa o poder pertence ao povo apenas em termos formais ou retóricos. O ato de votar em representantes não se confunde com o exercício real do poder, materializado em decisões tomadas cotidianamente. O poder está muito mais na potencialidade econômica e na inserção nas camadas do estado que na possibilidade de manifestar uma escolha em um dado momento.

Feita a escolha, as distâncias se alargam entre os mandantes e os mandatários e entre os mandantes e os burocratas não mandatários. Então, os serviços públicos fundamentais, como saúde e educação, não estão voltados a uma boa prestação porque as camadas que exercem efetivamente o poder não os consomem.

Não há interesse em prestações públicas eficazes de saúde e educação, no Brasil, porque os estratos sociais dominantes não são seus utilizadores finais preponderantes. Esses estratos preferem aumentar a apropriação de rendas e consumir serviços privados, deixando aos serviços públicos a tarefa de atender aos mais pobres e menos poderosos.

Para que fossem melhor prestados, esses serviços teriam que ter as camadas médias e médias-altas como destinatárias. Mas, observa-se precisamente uma inversão da lógica do serviço público, pois o estado dá subsídios a quem menos precisa, para que adquiram serviços privados em setores de participação pública formalmente universal.

Vigora no Brasil um absurdo que são as deduções de despesas médicas e educacionais privadas do imposto de renda devido anualmente. Essa renúncia fiscal é concentradora de rendas e ajuda precisamente a quem menos precisa de ajuda. Ademais disso, é destituída de lógica institucional porque se os serviços são públicos e universais não há razões para oferecer subsídios a quem os compra à iniciativa privada.

O dinheiro das deduções de despesas médicas e educacionais do imposto de renda deveria ser gasto nos sistemas públicos dessas duas áreas. É preciso jogar as classes médias e altas no Sistema Único de Saúde e na educação básica pública, para que elas melhorem para todos. Porque essas classes tem poder de reclamar uma melhora real das prestações.

Trata-se de envolver o máximo de pessoas, de classes sociais mais elevadas, no problema dos serviços públicos fundamentais, evitando que sigam sua trajetória de coisas para pobres e, portanto, coisas que podem funcionar mal. As prestações privadas de saúde, por meio de planos e seguros, não devem ser subsidiadas com dinheiros públicos, pois isso representa a iniquidade pelo duplo e chancelada pelo estado.

A dedutibilidade é o prêmio da inércia concentradora que permeia a história desse país. Por outro lado, retrata bem nosso oportunismo na apropriação de recursos públicos, sob os vários disfarces utilizados, sendo o mais comum o discurso meritocrático. O mérito aqui consiste em uma minoria retirar o máximo de uma maioria, por intermédio do Estado, embora esse devesse atuar para todos.

Essa sistemática explica porque os discursos repetidos à exaustão contra os tributos são essencialmente insinceros. Quem reclama contra os tributos altos sem correspondência com serviços públicos bons é precisamente o grupo que recebe compensações estatais indiretas, como salários maiores que as utilidades, isenções e subsídios. Na verdade, esse grupo paga poucos tributos por poucos serviços. Apropriou-se do estado para receber dele os meios financeiros de consumir serviços privados.

Os mais pobres, esses pagam muitos tributos por serviços ruins e são precisamente aqueles cujas reclamações são menos articuladas e menos tomadas em conta. Pagam mais porque fazem-no sobre o consumo, de forma inescapável. Proporcionalmente às rendas, um sistema que tributa preferencialmente o consumo, penaliza evidentemente os mais pobres.

Até mesmo por imperativo de coerência discursiva liberal e meritocrática, os subsídios embutidos nas deduções de despesas médicas e educacionais deviam ser absolutamente suprimidos. Quem pode e quer escapar dos serviços públicos de saúde, que o faça por sua conta e sem a ajuda da entidade que deveria provê-lo igualmente a todos.

Enfim, se as camadas mais ricas da sociedade brasileira tivessem que recorrer à saúde e educação básica públicas, rapidamente esses serviços melhorariam de nível, em benefício de todo o grupo.

Tentarão um golpe judiciário caso Dilma Roussef vença as presidenciais.

Kleroterion, dispositivo para o democrático sorteio ateniense

Um texto de Andrei Barros Correia.

Convém chamar as coisas por seus nomes e buscar a clareza. O direito, ou é a vontade do príncipe, ou é a vontade do povo. Não pode ser a vontade do juiz, excepto se o juiz dispuser-se a ser representante do povo ou do príncipe.

O que se chama cotidianamente de interpretação é a própria criação de normas. Se ela é menos drástica em causas entre pessoas, porque produzirá uma lei a interferir apenas nos litigantes, ela é bastante grave se estão em causa interesses amplos. Uma decisão judicial que envolva direitos públicos subjetivos aproxima-se deveras da lei em sentido formal e material, ou seja, da lei como a entendemos comumente, votada pelo parlamento e sancionada pelo chefe de Estado.

Existem legisladores e aplicadores da lei para que casos semelhantes tenham desfechos semelhantes, apenas fazendo-se os ajustes pontuais que as peculiaridades de cada qual requeiram. Ou seja, para que lei seja algo abstrato e genérico, molde vazio em que se verifica a continência de alguns fatos.

Se casos semelhantes merecem decisões diferentes, duas alternativas apresentam-se: ou não se trata de aplicação da lei; ou trata-se do juiz criando lei instantaneamente, o que é possível, mas implica a inexistência de separação de poderes e, no caso brasileiro, uma inconstitucionalidade evidente.

Não é preciso sentir o chão tremer e a claridade aumentar na estrada de Damasco para perceber os chamados ao golpe judiciário. Caso Dilma Roussef vença as eleições presidenciais de outubro, o grupo do seu oponente tentará um golpe judiciário. Se terá êxito, já é outra estória.

Há um dado de realidade interessantíssimo a ser considerado. Tornou-se comum o discurso segundo o qual os dois lados proeminentes do espectro político são basicamente a mesma coisa. E tornou-se comum a partir da difusão dessa idéia pelos oponentes ao grupo do Presidente Lula. É perfeitamente racional essa estratégia, pois não convém contrapor-se ao êxito e sim tentar dizer que todos se aproximam e fazem as mesmas coisas e têm, portanto, as mesmas condições de êxito.

Todavia, em alguns aspectos, todos agem semelhantemente mesmo. Trata-se das práticas de campanha eleitoral. A legislação eleitoral brasileira é uma farsa, elaborada sob medida para ser infringida e para permitir os maiores absurdos, que são os financiamentos ilegais das campanhas. Ela oscila entre o detalhismo excessivo, a obscuridade e, por vezes, a vacuidade. Ou seja, é um molde em que ou tudo cabe, ou nada cabe.

Como não quero alongar-me demais, nem reescrever as teorias política e do Estado, vou supor situações limites para evidenciar até onde pode o supostamente jurídico meter-se no político.  Se a candidata Dilma Roussef vence as eleições e tem a vitória impugnada por algum tribunal, o que ocorrerá se o seu oponente tiver praticado as mesmas infrações e o caso for levado a este tribunal? Dará soluções diversas e tornar-se-á personagem política ativamente parcial, este tribunal?

Anulará a eleição e convocará outra, com ambos os candidatos anteriores impedidos de participar? Provavelmente ignorará que as supostas infrações de uma candidata foram cometidas, quantitativamente e qualitativamente, pelo outro candidato e assumirá o poder real sem ter base para tanto. Será isso uma atuação democrática? No fundo, é melhor decidir no sorteio, como democraticamente fazia a Assembléia Ateniense para muitas magistraturas.

Essa tentativa golpista que se anuncia pode ser uma auspiciosa oportunidade de testarem-se os limites do jurídico e do político na prática brasileira de assunção dos comandos do Estado.

Os russos ganharam a II guerra mundial. Mais um pouco sobre a manipulação de informações.

Soldados russos em Stalingrado.

A informação em si não tem ideologia. A forma como ela é oferecida aos receptores tem. Entram em cena omissões, ênfases seletivas, mentiras e exagerações, a tornar em ideologia algum fato. Claro que algum fato pode ser suporte de uma ideologia, a dizer que ela produziu um êxito, mas o fato sem discurso não é mais que isso, é inerte.

Os russos, sob o que então se chamava União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, venceram a II guerra mundial contra os alemães. Não é algo de se estranhar, porque a guerra deu-se entre alemães e russo e, portanto, seria vencida por um dos dois. Evidentemente, essa conclusão não implica negar a participação de outros povos, secundariamente.

Os espaços vitais buscados pela Alemanha não estavam em outro sítio senão na URSS. Com o restante da Europa, Adolfo Hitler construiria uma União Européia avant la lettre, com a capital em Berlin e, não em Bruxelas ou Strasburgo, evidentemente. Nisso retomava parcialmente o que Bonaparte fez com mais engenho e sucesso, com a sede em Paris. Napoleão federou e seduziu os tedescos do Reno e seduziu e avassalou os italianos do Vale do Pó e da Emília Romana. Durou mais e ficou nas mentes de quem experimentou.

Adolfo Hitler destinou 3/4 dos esforços de guerra alemães à frente oriental, o que é sinal evidente de onde a guerra foi lutada. Muito embora cinema e sub-literatura tenham incutido profundamente nas mentalidades as supostas importâncias de detalhes como a guerra no deserto e outras coisas deste tipo, como o desembarque na Normandia, a guerra ocorreu do Elba para oeste.

Winston Churchill, que não era minimamente tolo, pode registrar nas suas memórias que enquanto se divertiam com seis (06) divisões alemãs na frente ocidental, os russos enfrentavam cento e oitenta e cinco (185) divisões alemãs. Simplesmente, trinta vezes mais! Um estúpido pode continuar a não compreender, mas um parcial que preze minimamente o que traz dentro do crânio pode até calar-se, mas não pode ignorar a evidência.

O mesmo Churchill sabia muito bem que Adolfo Hitler havia poupado os soldados ingleses em Dunkerque, permitindo que se evadissem, embarcando de retorno à ilha. Chegava a ser constrangedor e, por isso mesmo, o episódio foi habilmente tornado em uma escapada conseguida com muito esforço. A verdade é que a Wehrmacht deixou-os evadirem-se, porque o Fuhrer ofereceu um gesto simpático aos ingleses.

Na resolução de fazer a guerra à Rússia houve fartas doses de sub-avaliações. O General Halder teria ocasião de dizer, um mês depois de iniciada a ofensiva, que a estimativa de enfrentar 200 divisões era equivocada, pois havia aproximadamente 360! A opinião do General Bluimentritt também é significativa do obstáculo e do histórico desprezo de alemães e russos por poloneses. Ele diz que a resistência e capacidade de lutar dos russos nada tinha a ver com a incapacidade dos poloneses.

Já em 11 de agosto de 1941, Franz Halder, o General bávaro de vastos serviços militares prestados à Alemanha, diria que é cada vez mais evidente que subestimamos o poderio desse colosso russo não só na esfera econômica, como, também, na militar.

O comentário mais revelador veio do Marechal-de-Campo Gerd von Rundstedt, um aristocrata prussiano em serviço desde 1892,  que se havia retirado em 1938, ao saber que Fristch havia sido espionado pela Gestapo. O Fuhrer o reconvocou ao serviço ativo às vésperas do início das hostilidades. Ao que tudo indica, Rundstedt era um militar e só isso.

Capturado, ao fim da guerra, o Marechal-de-Campo Rundstedt disse: Percebi, logo depois de termos começado o ataque, que tudo o que se escrevera sobre a Rússia não passara de tolices.

De minha parte, creio que Adolfo Hitler era mal dotado como militar e levou a esse campo a mitomania que funciona na esfera política. Na política, super estimar ou sub-estimar são rotinas próprias desse âmbito de atuação. Na guerra, é a diferença de gastar demais ou perder. É significativo que muito oficias alemães tenham alegado, no embuste de Nuremberg, que eram apenas militares no desempenho de suas funções: e muitos eram apenas isso.

Terminada a guerra, a parte do mundo em que vivo passou a aclamar-se como única vitoriosa de um grande conflito. E passou a produzir material de propaganda desse êxito, negando o real obtenedor da vitória. Claro que isso esteve e está perfeitamente inserido na necessidade de escamotear qualquer mérito de um novo oponente.

Esse esforço teve sucesso, porém ao custo de ignorância. Passado o tempo e aumentada a distância dos fatos, esse sucesso cobra um preço grande, porque aquilo que era feito deliberadamente por quem sabia o que fazia, passa a ser uma verdade crível para quem vem depois. E até para os sucessores de quem vendeu a mentira propositadamente. Hoje, é como se o vendedor do entorpecente o consumisse!


Lembranças esparsas de Lima, de Cusco e de Machu Pichu.

Tínhamos acabado de chegar a Lima, Olívia, eu e Daniel, e pusemo-nos a caminhar, que é o melhor que se faz. Chegamos na Plaza San Martín e ficamos a olhar em volta e a reparar na beleza paisagística e arquitetônica dessa praça meio belle époque, meio neoclássica, tão bem desenhada e cuidada. Eis que surge uma equipe da TVSur, da Venezuela, em seis daqueles imensos jipes Hummer norte-americanos.

Um repórter e um câmera vêm até nós. Bom dia, são daqui? Não – dissemos – somos brasileiros. Podem gravar um testemunho para uma matéria sobre os caminhos da América Latina, que fazemos? O que não gostamos, nos persegue. Fiquei calado e todos ficaram. Olívia e Daniel, ajudem-me e corrijam-me, que a memória vai fraca.

Lembro que, pelas tantas, disse: meu castelhano não dá para isso. O repórter, que era argentino, disse: isso que falas é suficiente e emendou: o que acha da integração sul-americana? Gelei e pensei que ou gaguejava em um castelhano para lá de precário, ou emendava a dizer o que achava, e aí seria tomado por tolo, louco, ou idealista. Pouco importa.

Somos diferentes de vocês, de vocês que falam castelhano e lembram-se de San Martín encontrando-se com Bolívar aqui, em Lima. Não temos a cultura do Altiplano, nem a noção de vários países estarem ligados por uma língua e uma cultura indígena assemelhada. Para teres uma idéia, lembra de Ernesto Guevara. Ele saiu da Argentina e foi parar na Venezuela e não passou pelo Brasil. Isso não é bom, nem ruim, apenas a integração é possível, mas o Brasil é outra coisa.

O repórter ficou com cara de quem escuta um louco, mas parecia encantado. Acho que não era o que esperava. Lembro bem que minha intenção era realçar a beleza da relativa unidade cultural dos povos sul-americanos de fala castelhana e quéchua e aimará e  guarani e outras línguas mais. E deixar claro que os brasileiros somos diferentes, nem melhores, nem piores, mas diferentes.

Acho que foi daquelas entrevistas que o editor elimina.

O sítio mais cosmopolita em que já estive: Cusco. Uma coleção de belezas pré-incáicas, incáicas e coloniais castelhanas.

Mil e uma recomendações quanto ao soroche, o mal da altitude, o que não é excesso de cuidado em uma cidade a 3.500 metros do nível do mar. Sempre se diz: chegando a Cusco, repouso de uma hora, deitado, e muito mate coca. Caminhadas suaves, nada de bebidas com gás ou comidas gordurosas no primeiro dia, principalmente à noite. O soroche não é brincadeira.

Não é mesmo. Daniel troçava comigo. Estás perdido, Andrei, não fazes exercícios, bebes, fumas, vai botar os bofes pra fora. Chegamos, cumprimos as recomendações, tomamos chá de coca, deitamo-nos por uma hora e saímos a caminhar bem lentamente. À noite, achamos um restaurante simpatissíssimo. Sentamos na varandinha pequena – só cabíamos os três – e pusemo-nos a comer  truta grelhada e a beber Cuzqueñas. Lá pelas tantas, Daniel começa a ficar entre branco e verde, como uma folha de coca.

Era o maldito soroche. Chamamos o garçom, que diagnosticou o mal e prescreveu a receita. Entramos – porque na varanda fazia um frio danado – e ele trouxe um pratinho com folhas de coca. Amassou-as cuidadosamente e disse: põe entre os dentes e fica a pressionar, em pouco estás bom. Como em pouco não era tão pouco, Olívia e eu ainda pudemos tomar mais umas Cuzqueñas até que nosso estimado desportista ficasse bom.

Machu Pichu é objeto de desconfiança de muitos, do tanto de que se fala do sítio. Bobagem, é belíssimo mesmo. Saindo de Cusco, de trem, percorre-se um caminho que, descendo de 3.500 a 2.400 metros de altitude, permite ver a transição do altiplano – da serra dos Andes – até as elevações que antecedem a vasta planície amazônica. Uma fartura de montanhas e água e verde.

Ao pé da montanha está Machu Pichu Pueblo, ou Aguas Calientes, onde se situam as hospedarias. O rio faz a curva em Aguas Calientes, abraçando a vila toda e lembrando de sua existência com o permanente som das águas rápidas em leito de pedras.  Fomos lá para passar apenas dois dias e voltar no dia seguinte.

Falar de visita a Machu Pichu deve ser algo econômico, para não alinhar a coleção habitual de lugares-comuns. As vistas são bonitas a ponto de surpreender e surpresa é algo que raramente se tem. Voltamos a Aguas Calientes, muito cansados, e resolvemos retornar a Cusco mais cedo, no dia seguinte. Foi idéia da mente clara de Daniel e foi ótima idéia.

Fomos à estação do trem tentar marcar a viagem para mais cedo, mas não foi possível. Então, surgiu uma alternativa. Pegávamos o trem que saia mais cedo, para Ollantaytambo, e de lá apanhávamos um carro com o Edgar. Deu certo. O Edgar era uma figura fantástica de peruano índio do Altiplano. Saímos serpenteando pelas estradas do Vale Sagrado, rumo a Cusco.

Próximo a Cusco, antes de uma aldeiazinha, o Edgar aperta os olhos, vê mais longe, e entra à direita, na aldeia. Pára e diz: esperem um pouquinho. Sai, vai até a esquina, olha e volta. Liga o carro e sai precisamente na hora que a polícia estava ocupada com outros carros. É que não se pode fazer transporte de passageiros, explica. Pergunto: a ellos, les gusta mucho la plata. Oh, solo les gusta eso!

Tiramos uma fotografia com ele, mas aqui imperará o princípio da impessoalidade fotográfica.

Os dois gols mais bonitos de 1982.

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Brasil e União Soviética, em Sevilha, terminou 2 x 1. O gol da URSS foi uma falha imensa de Valdir Peres, o goleiro brasileiro.
Sócrates fez um gol esplêndido, depois de driblar dois e chutar a bola no único local onde Dassaiev – o maior goleiro de então – não a buscaria.

Aos 44 minutos do segundo tempo, Paulo Isidoro cruza a bola, rasteira, em direção ao ponto de entrada da grande área. Falcão, inteligentíssimo, abre as pernas e deixa passar a bola e Éder a toca apenas duas vezes. O primeiro toque, levíssimo e só para a levantar um pouquinho. O segundo, uma patada fenomenal, de esquerda, rumo direto às redes. Dassaiev está parado e fica assim até a bola retornar do fundo das balizas.

É interessante notar o comentarista queixando-se do esquema tático brasileiro, que devia ser mais ofensivo, poucos segundos antes do segundo gol, o de Éder. Não sei quem era o comentarista, mas queixar-se de falta de ofensividade daquela equipe! Esse camarada deve ter morrido de infarto nas partidas de 1990!

A retranca, o ferrolho, a feiúra futebolística da Inter travou o Barcelona.

No futebol, não ganha o melhor, que isso é confundir êxito com beleza. Ganha quem ganha, o melhor é quem joga mais bonito. Para além de quanto idealismo haja nessa afirmação, convém lembrar quais os objetivos por trás disso que é jogar futebol.

Antes, muito antes, de se pensar em campeonatos organizados, em número de adeptos, em potencial comercial, em preço de transferências, pensou-se em jogar. Na raiz, joga-se por prazer, tanto que houve amadorismo por muitos anos. Claro que isso associa-se à natural busca pela glória, que se relaciona com a vitória.

Um e outro dicotômico de pensamente hei-de-vencer-a-qualquer-custo pode pensar: esse fulano que escreve é um tremendo idealista tolo, que faz propaganda da derrota. Não é isso. A vitória é necessária para os egos, para os excessos dos adeptos, para se venderem camisetas, chaveiros, perfumes, cuecas, bandeiras, telefones, toques, musicais e outras coisas mais.

A beleza é necessária para se saber que as atividades humanas podem ser criativas. E é mais rara. E também triunfa, mas não foi dessa vez.

Um avião de caça ecológico. Piada ou apenas contradição em termos?

F/A-18 Green Hornet.

O caça da fotografia acima é um F/A – 18 Super Hornet, semelhante ao que os norte-americanos querem vender ao Brasil, sem repassar a tecnologia. Mas, ele tem uma peculiaridade, é o primeiro caça movido por uma mistura de 50% de querosene de aviação (Jet A-1) e biocombustível de matriz renovável. Por isso, pôde ser batizado de Green Hornet, epíteto bastante criativo e evocativo da simpatia ambiental da aviação da marinha norte-americana.

O jato de guerra foi anunciado no Dia da Terra, 22 de abril passado. É fantástica a celebração ambientalmente correta em um equipamento voltado, exclusivamente, para a destruição e otimizado ao máximo para essa finalidade. Protege e destrói o ambiente ao mesmo tempo.

Claro que o programa da marinha norte-americana é voltado à segurança energética, ou seja, à redução da dependência de combustível fóssil. Todavia, não recuaram um milimetro na teatralização da coisa como uma marcante conquista ambiental.

Green Killer ficaria mais adequado, porém menos simpático.

Belo Monte, eficiência energética, impacto ambiental e outras circunstâncias, por Sidarta.

Na anterior postagem sobre a usina de Belo Monte, chamada Eco-tolice e eco-chantagem contra a Usina de Belo Monte, o comentarista Sidarta ofereceu um comentário precioso. Passeia por conhecimentos sólidos de geração de energia, indo até ciência política, economia  e relações internacionais. Resolvi torná-lo uma postagem.

Andrei e João Ezaquiel,

Peço já desculpas a vocês e aos outros participantes do debate se estou me estendendo muito nesses comentários, se estou “ensinando pai-nosso a vigário” ou se estou saindo do tema.

Sobre os seus comentários técnicos a respeito de Belo Monte e de outras opções de geração de energia elétrica, vale lembrar que uma tese de doutorado defendida há menos de 5 anos no Imperial College de Londres, por um engenheiro aqui do Recife, mostrou que o sistema elétrico do Nordeste do Brasil não suporta receber muito mais do que uns 2000MW de geração alternativa local “não despachável”, eólica, por exemplo (ou mais ou menos 20% da potencia instalada).

Tentar gerar muito mais do que isso com eólica (das fontes alternativas já bem dominadas a eólica é a que tem se mostrado mais viável no momento) torna o sistema elétrico instável e complicado para se otimizar o despacho da geração e passa a se correr o risco de jogar água fora nos grandes reservatórios para se aproveitar a energia eólica eventualmente gerada em grandes blocos “fora de hora”.

Hoje em dia, a nossa experiência mostra que se suporta mais de 75% de racionamento de água (um dia com água no cano da rua e três dias sem)… pois é assim, ou pior, que a maior parte da população urbana da maioria das cidades de Pernambuco tem vivido.

Por outro lado, um racionamento forte de energia elétrica em anos passados na Colômbia mostrou que um corte na oferta de menos de 40% já paralizava a economia, gerando desemprego em massa e mais desordem social.

Não há como se estocar “energia elétrica” em grande escala, o que se estoca é combustível ou água nos reservatórios – mesmo uma bateria “cobra pedágio elétrico” para armazenar e restituir a sua energia: uns 10 a 20% para guardar e mais uns 10 a 20% para restituir.

Um exercício interessante é calcular o custo do MWh produzido por uma pilha alcalina AA… se você acha que a gasolina está cara e que paga muito imposto de renda, nunca mais vai querer usar energia de pilha não recarregável).

Essa é uma das razões porque Hugo Chaves está administrando atualmente um pequeno racionamento de energia elétrica na Venezuela com o exército de prontidão para segurar a inquietação social… além de ter iniciado programas emergenciais de suporte a desempregados e a pequenos produtores industriais e agrícolas mais prejudicados com o problema…. um problema de Hugo Chaves.

Pelo lado econômico da produção, o custo da energia eólica em grandes blocos é umas duas vezes o custo de hidráulica… e o custo da energia de térmicas movidas a derivados de petróleo ou a gás (não temos tanto gás assim para rodar grandes térmicas sem parar algumas indústrias já em funcionamento no Nordeste) é ainda maior, sem falar na poluição do ar.

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