O estado de exceção é a resultante da suspensão de uma ordem jurídica a bem de sua própria manutenção. Como diz Giorgio Agamben, ele apresenta-se, nessa perspectiva, como um patamar de indeterminação entre democracia e absolutismo.
Nessas situações o âmbito político reivindica a não submissão ao jurídico e pretende auto normatizar-se constante e especificamente para cada situação concreta. A reivindicação sempre vem acompanhada de motivação e finalidade. A primeira é a existência de uma suposta degenerescência do estado e da sociedade, a reclamar autoridade. A segunda é precisamente salvar o estado e a sociedade da degenerescência apontada.
As consequências são o falecimento do que se dizia querer salvar. Em essência, é um discurso desonesto. Primeiro que a exceção torna-se maior que alguma regra e, portanto, deixa de ser excepcional. Segundo que a autoridade e a manutenção da exceção tornam-se os fins.
Algumas aventuras de exceção iniciam-se a partir de reais emergências, cumprem suas finalidades e observa-se o retorno do sistema. Assim vividas, são efetivamente suspensões temporárias. Todavia, na maioria dos casos, lança-se mão do discurso desonestamente, por estratégia política imediata. Não há os perigos apontados e, portanto, não são necessários os remédios prescritos.
No Brasil de hoje, em ano de eleições presidenciais, o discurso de exceção vem à tona, nas suas linhas iniciais. Certos grupos afirmam a ocorrência de ameaças que não existem e, de resto, a coisas que nunca prezaram realmente. É preciso dizer que neste país pouquíssimos prezaram e prezam a democracia, o que não é de espantar porque ela é um amontoado de sombras. Nunca existiu propriamente e seria difícil gostar-se de uma coisa assim tão etérea.
Não se devia confundir a perda de eficácia de um meio de propaganda – a imprensa – com o perecimento da liberdade de se dizerem as coisas, porque são diferentes. Assim como não se confundem o esgotamento da gasolina de um automóvel com o fim do direito a locomover-se livremente.
É vil acusar-se alguém de representar ameaça a direitos e garantias fundamentais apenas para gerar medo nos outros. E quando esse alguém não deu qualquer sinal de ser esta ameaça. Aqui, a falsificação soma-se à desonestidade política. E a desonestidade em segundo grau torna-se evidente ao observar-se que os afirmadores da ameaça foram cevados em um ambiente exatamente igual ao que afirmam temer!