Um comentário d´O contemplador à postagem imediatamente abaixo. Sem edições quaisquer.

Muito oportuno e bom, tema e texto.

A propósito, o meu office ainda é um 2003 legalizado e não sei usar o powerpoint; uso somente o word para fazer alguns textos mais simples e sou um razoável usuário do EXCEL, que resolve os meus problemas com contas.

Em 1983 tive a oportunidade de conhecer pessoalmente um dos maiores pensadores práticos da hidrologia do mundo, e ídolo dos hidrólogos, o eng. grego/americano Matalas, de quem eu conhecia e aplicava (e ainda aplico) os seus modelos em meus estudos de hidrologia.

Estava junto a outros 9 colegas brasileiros em Washington DC, nos EUA, no U.S. Geological Survey, em uma sala fechada com uma longa mesa retangular e umas 15 cadeiras em torno, esperando para a chegada triunfal de Matalas, provavelmente acompanhado de um séquito de puxa-sacos, quando entra na sala, sozinho, um cara alto, magro, míope, fumando, gravata desalinhada, agitado e muito simples e simpático.

Perguntou em inglês se nós éramos os brasileiros e rapidamente entabolou uma conversa sobre os problemas que tínhamos ido estudar nos EUA (ele tinha se preparado para a conversa conosco e não enrolou ou nos fez perder o nosso tempo e também o dele).

Depois de uns minutos iniciais de conversa já solta disse, “ah, esqueci-me de me identificar, sou Matalas”.

Naquele clima de estar diante de Deus, ele nos trouxe rápido para o panteão e começamos a conversar sobre problemas de planejamento, de soluções e de métodos matemáticos, e foi aí onde ele deu um inesperado show.

Esperávamos que ele falasse em modelos matemáticos sofisticados e ele sintetizou, com uma simplicidade angelical, como estava o estado da arte para o que precisávamos (se podíamos diagnosticar o nosso caso usando um simples raios-X não havia necessidade de usar um caro e raro PET scanning ou coisa parecida), sem invocar nada além dos parâmetros estatísticos “média e desvio-padrão”.

Não usou powerpoint nem giz, fez uns rabiscos em umas folhas de papel (que coletamos e xerocamos como se fossem os pedaços das tábuas de Moisés que se quebraram) e nos passou a tranquilidade entendida pelos bons médicos “de que a clínica é soberana”, ou seja, fazendo as perguntas certas consegue-se chegar ao mais importante que é entender o problema.

Deveríamos gastar o nosso tempo pensando e tentando perceber a “verdade subjacente” e deixar para um computador fazer as contas de que necessitávamos.

Implicitamente trouxe-me a lembrança da frase de Deng Xiao Ping: “Não interessa se o gato é preto ou branco, interessa se caça rato”.

Nunca pensei em ser professor para não ter que me tornar conformista com os rituais, com o teatro e com a obrigação de ensinar os alunos somente a responder, quando ensinar a perguntar parece-me ser tão importante quanto.

Em um dos bons treinamentos formais que recebi na minha carreira profissional, um palestrante disse que nas instituições existiam CP’s, BDC’s e QSP’s, ou seja, “cabeças-pensantes”, “burros-de-carga”, e “quantidade-suficiente-para” (aquela água que se adiciona ao pó do antibiótico para não tomá-lo seco).

A maior parte das pessoas nas instituições formais de ensino médio e universitário pouco dedicado é comodamente treinada, infelizmente, para ser BDC ou QSP, e não CP (… um CP em uma turma de alunos pode ser uma ameaça a um professor medíocre).

Espinoza já denunciava o refúgio na ignorância como um dos maiores pecados das pessoas. Temo a Espinoza…

Nos meus tempos no ginásio católico no interior da Paraíba havia um coroinha que na missa do domingo, quando mudava um livro de lado conseguia se ajoelhar bem no meio do altar, com uma simetria e uma elegância ritualística bem ensaiada.

A sua parelha não era tão bem adestrada e se ajoelhava com alguma assimetria em relação ao centro do altar, atraindo um olhar crítico do padre celebrante do sacrifício.

Fico na dúvida se aos olhos de Deus e de Jesus isso tinha alguma importância…., ou seja, um coroinha assimétrico é capaz de baixar o valor do sacrifício do AGNUS DEI QUI TOLIS PECATA MUNDI?

Adianto que fiz o treinamento básico de coroinha, em latim, mas nunca fui convocado para jogar no time titular, talvez por conta de não conseguir desenvolver nem aceitar que o mundo fosse simétrico… e também por tentar traduzir e entender o texto em latim que eu estava respondendo ao padre e começar a ter dúvidas sérias se já não estava praticando falsidade ideológica fingindo acreditar no que dizia.