Um espaço de convívio entre amigos, que acabou por se tornar um arquivo protegido por um só curador.

Tag: The Beatles

A revolução da construção, a autopista e quando o baixo não é mais a base de uma música.

Um texto de Alcides Moreira da Gama.

Existe algo de fascinante nas músicas, mesmo naquelas que pessoalmente não apreciamos, porque, sem explicação, ela consegue mexer conosco. Mais fascinante ainda são as pessoas cujos dons musicais comovem. Não tenho dúvida de que já nasceram com esses dons.

Um instrumento musical que consegue me impressionar é o baixo. Normalmente ele é utilizado para dar base às músicas. É como um alicerce cujas paredes e teto são construídos sobre ele. Previsivelmente, é isso que se espera de um baixo: a música é montada tendo-o como base. Quando são medianamente tocados, suas notas são previsíveis. Supõe-se que, quando é tocado sem muita expressividade, ao ouvirmos uma música qualquer, já deduzimos em qual tempo e tom a nota será emitida. Mentalmente e quase inconscientemente já antevemos e aguarmos aquela nota que será tocada, até que ela é emitida, confirmando o que já era esperado.

Mas há casos que extrapolam a normalidade, e a surpresa de cada nota milimetricamente tocada no devido tempo musical é um espetáculo à parte. O que era uma previsibilidade quase monótona – o que se espera de um baixo tocado sem muita expressão – é um espanto e sobressalto a cada nota musical lançada. O ouvinte fica pasmado, quase congelado. A imprevisibilidade e eloquência das notas do baixo assim tocado tomam conta de todo o enredo musical. É um prazer inesperado para o ouvinte, que tem a sensação de que, embora cada nota seja temporalmente calculada, a imprevisibilidade impera.

É o que se pode dizer de revolução na construção: é quando o alicerce deixa de ser alicerce, e as paredes e teto passam a ser a base; é quando o baixo deixa de ser a base da música, e a música se torna a base para o baixo; é quando a música serve de autopista para o baixo desfilar sobre ela. Aí está a demonstração:

The Beatles – Rocky Raccoon.

Não por acaso, Rocky Racoon é a ultima música que entra na lista, é que tambem é pra ela que eu mais gostaria de chamar a atenção. Pra galera que diz que Beatles é iêiêiê, de forma pejorativa… Triste… =)

http://www.youtube.com/watch?v=wNRH7_Kd5Yc

O papa é pop, e gosta dos Beatles…

No dia 4 de março de 1966 John Winston Lennon deu a seguinte declaração:

“Christianity will go. It will vanish and shrink. I needn’t argue with that; I’m right and I will be proved right. We’re more popular than Jesus now; I don’t know which will go first – rock ‘n’ roll or Christianity. Jesus was all right but his disciples were thick and ordinary. It’s them twisting it that ruins it for me.”

Numa tradução “meia boca” pro português ficaria algo mais ou menos assim:

“O cristianismo vai acabar. Vai encolher e desaparecer. Eu não preciso argumentar isso, eu estou certo e vai ser provado que estou certo. Nós somos mais populares que Jesus agora; eu não sei qual acabará primeiro – rock’ n’ roll ou o cristianismo. Jesus estava bem, mas seus discípulos eram grosseiros e ordinários. São eles distorcendo isso que o faz em ruínas para mim. “

O que disse Lennon, a princípio não gerou problema ou polêmica alguma na Inglaterra. Já quando chegou aos Estados Unidos… Até o KKK impediu apresentações da banda por crer ser o certo a se fazer.

A despeito do Galileu (não o Cristo, o Galilei =)), que levou mais de 300 anos para ser perdoado apenas por desobedecer ao papa da época (Urbano VIII), divulgando suas teorias heliocêntricas em países protestantes onde a censura do Vaticano não chegava. John Lennon e companhia limitada, foram perdoados até com certa celeridade, levando em consideração que o próprio Vaticano os considerava meio satânicos. Interessante notar que a morte, prematura ou não, de alguns membros da banda , incluído ai o próprio Lennon, deve ter mesmo ajudado no exercício do perdão. Mesmo porque a matéria veiculada no L’Osservatore Romano (Diário de notícias oficioso do Vaticano), fala em preservação ante a “experiência deprimente de grupos de rock geriátrico”, como se previsse que num futuro alternativo onde Lennon e Harrison fossem vivos, saberiam que eles não mais trabalhariam com música e como se McCartney e Ringo tampouco o fizessem.

Perdão, real ou não, poderia ser mais convincente, até porque deve mesmo ter sido escrito por uma pessoa que se presume capaz para tanto. Mas não, foi apenas mais uma tentativa de angariar fiéis, jovens. Em tempos de pedofilia correndo solta, precisa-se fazer algo. Quando vi a manchete, a princípio, temi por ser fan da banda errada (se o papa diz que está certo, tem de haver algo errado com a “coisa”, seja ela qual for), mas ao invés disso quando li um pedaço da notícia, já notei que não tinha nada com que me preocupar…

É apenas o Vaticano em época de eleições, procurando votos, e assim sendo, poderiam se dar melhor, escolhendo algo mais atual, ou que pelo menos seus membros pudessem ainda se defender, de poder ser “banda de rock geriátrico” que já foi maior que Jesus, à qual seus apóstolos “grosseiros e ordinários” recorrem para angariar fiéis.

Ringo Star, último membro vivo do grupo, recusou o perdão…

“Didn’t the Vatican say we were satanic or possibly satanic — and they’ve still forgiven us? I think the Vatican, they’ve got more to talk about than the Beatles.”

De novo, na tradução macarrônica:

“O Vaticano não comentou que fomos satânicos ou possivelmente satânicos — e mesmo assim nos perdoam? Eu penso que o Vaticano tem outros assuntos a tratar, mais importantes que os Beatles.”