Um espaço de convívio entre amigos, que acabou por se tornar um arquivo protegido por um só curador.

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Lombo de porco com gengibre e mel.

Dia feriado, resolvo-me a ir ao mercado logo cedo. Tenho essa mania, que só encontra obstáculo nas filas imensas que há em todos os mercados, em quase todas as horas. São filas de quem vai a pedir favores, não de quem vai às compras. Um profundo desrespeito com os consumidores, esses seres complacentes e resignados a esperarem muito para comprarem caro.

Essa gente dos mercados deve estar a ganhar rios de dinheiro. A economia avança imensamente, toda a gente das classes mais baixas põe-se a comprar o que sempre quis e não podia. As grandes redes, francesa e norte-americana, praticam a quase escravidão com seus funcionários e contratam poucos.

Ou seja, investem pouco, drenam o sangue dos funcionários e vendem caro. Sim, vendem quase tudo mais caro que na Europa, até os produtos produzidos aqui mesmo. Servem-se da falácia dos custos tributários e da verdade dos custos logísticos para justificarem os preços altos.

A falácia tributária é claríssima, pois pagam-se mais impostos na Europa, além de maiores salários e encargos previdenciários. A questão logística realmente é um fator encarecedor de tudo no Brasil.

Bem, o fato é que cheguei ao mercado às dez horas e já havia uma imensa fila! Quase desisto de comprar as bobagens que buscava; uns sabonetes, desinfetante, água e o que seduzisse a vista. Resignei-me, todavia, a enfrentar a estúpida fila, devida à bestial economia na contratação de funcionários para as caixas.

Pus-me a perambular no mercado e, pelas tantas, detive-me em frente a um bonito lombo de porco. Pensei imediato: esse vai comigo para casa. Vai só, desacompanhado de qualquer tempero, quando chegar penso na forma de cozinha-lo com o que houver.

Havia gengibre em pó, pimenta-do-reino, alho, vinagre, azeite, um pouquinho de mel e laranjas! Cortei o lombo ao comprido, em três partes, que dispus em uma assadeira pequena. Furei os pedaços com uma faca de cozinha, para os temperos penetrarem a carne rapidamente, que não haveria muito tempo para apurarem.

Joguei por cima da carne muito gengibre em pó e pimenta-do-reino, virando os pedaços para que os dois lados fossem impregnados. No vidrinho em que havia um resto de mel despejei o sumo de uma laranja, um pouco de vinagre e um pouco de azeite. Esse caldo doce-azedo foi vertido em cima da carne.

Cortei quatro dentes de alho em fatias, ao comprido, e deitei-as sobre a carne, sem ordem. Deixei tudo a descansar assim por meia hora e levei então ao forno baixo por quarenta minutos. Não podia dar um mau resultado e não deu. Comi com pão integral a carne que ficou suculenta e bem molhadinha, sabendo discretamente a mel e gengibre.

Depois disso? Um cochilo na rede e a certeza de que algumas vezes os deuses conspiram a nosso favor. Algumas, porque nem sempre estão assim bem dispostos.

Toma-se um pernil de porco sem osso…

Nunca segui receitas, embora sempre as tenha lido. Trata-se de ter uma idéia, pois a calibração exata de quantidades e tempos de cocção faço-as de improviso.

Ontem, resolvi tomar um pernil de porco sem osso, pequeno, e corta-lo em pedaços retangulares, de mais ou menos 10 centímetros, por 3 de altura, ou seja, uns tijolinhos de porco. Pus os pedaços em uma assadeira e joguei em cima um pouco de sal, um pouco de pimenta do reino, muitas folhas de louro, quebradinhas, vinagre e azeite bastante.

O porquinho assim temperado foi descansar na geladeira por um dia. Quem supuser que isto pode acabar por dar em parentes próximo de rojões minhotos, supõe mais ou menos certo, embora o destino seja outro.

Passado o dia da marinada, hoje à noite, tomei dos pedaços e cortei-os em tirinhas finas e curtas. Reservei o apetitoso caldo com os sucos da carne, o vinagre e o azeite. Em uma panela grande, despejei esse caldo e acrescentei mais um pouco de azeite e  umas folhinhas de manjericão.

Refoguei uns pedaços de alho mal cortado, em fogo alto e, passados uns instantes, deitei na panela os pedaços de porco. Mexi um bocadinho e tampei a panela.

Depois de uns cinco minutos, adicionei extrato de tomate e mais umas folhinhas de manjericão, baixei o fogo e fui cuidar do acessório. Macarrão em formato fusilli, ideal para reter o molho nas dobras de seus parafusos. Aqui, não há mistérios, água fervente, põe-se o sal, põe-se o fusilli e esperam-se uns sete minutos.

Resultado, um espetacular macarrão com porco. É verdade que inadequado aos 30º que fazem agora, mas, a despeito do suor que desce na testa, estava ótimo.

Para despertar saudades em Thiago: cuscuz com porco.

Quando recebemos nosso amigo Thiago em Braga, em setembro de ano passado, quisemos agradá-lo com algo que ele não saboreava há muito, pois estava em terras castelhanas: cuscuz.

Não sabíamos que o cuscuz estava entre as imensas saudades de Thiago, o que valorizou a idéia. Daí, entregamo-nos à comezaina de cuscuz com porco guisado – esse porco não ficou lá grande coisa, obra minha – à noite e, no dia seguinte, cuscuz com ovos mexidos. Um regalo cuscuzeiro!

Fizemos agora uma extravagância gastronômica, o que me lembrou das saudades do cuscuz, de Thiago. Tomamos uma peça de picanha de porco, cortamos-la em fatias e deixamos-la numa marinada com azeite, gengibre, muito alho, cebolinha e coentro. Essa maravilha da anatomia porcina dormiu banhada nesses ingredientes dos deuses, que lhe penetraram as entranhas lentamente, a noite toda.

Hoje, essas fatias de suíno marinado foram ao forno, em lume baixo e lento. Entretanto, a farinha de milho em flocos – o que vem a dar no famoso cuscuz, repousava alguns minutos, depois de levemente humedecida e salgada. Foi à panela – aquela panelinha que faz cuscuz em forma de peitos – e saiu de lá dourada e fumegante.

Cuscuz nos pratos, desenformados e espalhadinhos, pusemos o molho resultante do assado do porco por cima, com os dentes de alho assados dentro da piscina de azeite, ao lado. Mais ao lado, as suculentas fatias da picanha suína cozinhada em líquido e assada em lume baixo.

Na falta de jovens vinhos durienses a preços razoáveis – pois aqui qualquer vinho português é caro – recorremos a um honesto chileno tinto. Um vinhozinho do Vale do Aconcagua, feito só de uvas Syrah, jovem, pouco complicado e pouco agressivo. Uma pechincha de dezenove reais. Por três euros beberíamos vinho melhor, mas estamos no Brasil…

Depois desse repasto delicioso, laranja cravo para a sobremesa. Essa tangerina pequena e doce é coisa bem nossa, como cuscuz. E ajuda a digestão das gorduras suínas. Depois disso, certo de ter despertado grandes saudades culinárias no querido Thiago, um cochilo!