Não pretendo avançar até conclusões, apenas indicar algo interessante e sugerir possibilidades. Fato é que reformados pentecostais e neo-pentecostais tornam-se, mais e mais, filo-judaicos.
Há poucos dias, aconteceu algo notável, em São Paulo: o conhecido pastor Edir Macedo, dirigente de uma igreja neo-pentecostal, inaugurou um imenso templo que se pretende réplica do abatido de Salomão, em Jerusalém. Na cerimônia, o pastor caracterizou-se como rabino e usou quipá! É curiosa a referência, porque se é rabino, não é pastor, e vice-versa.
A reforma, nas suas vertentes pentecostal e neo-pentecostal, é profundamente anti-pauliana e contraditória. O judeu grego que teve visões a caminho de Damasco triunfou sobre a facção de Tiago, irmão de Jesus, e permitiu que houvesse o cristianismo autônomo, ou seja, não como mais uma seita do judaísmo. A sabedoria de Paulo foi muito helênica mesmo, porque a solução é perfeita do ponto de vista lógico formal.
A nova aliança celebrou-se sem limitações quanto a uma parte e sem requisitos prévios para ingresso. Não era necessário ser antes judeu para ser cristão, eis o que permitiu a difusão do novo preconceito monoteísta que se iniciava. E isso fazia todo sentido, porque Jesus foi considerado Messias e, portanto, a ser isto verdade, o encerramento do judaísmo.
A proposta foi audaciosa e bem desenhada, deve-se reconhecer. Nesta perspectiva, os textos do velho testamento foram mantidos como uma genealogia e nada mais. Do surgimento do Messias e da celebração da nova e ampla aliança, salta-se por sobre um imenso vácuo atemporal até a parúsia, a volta que iniciará a comunhão plena dos relativos com o absoluto.
Isso é absolutamente incompatível com o judaísmo, que espera o Messias e opera um esquema lógico aparentemente mais simples. Aqui, não há aliança ampla; há uma aliança com um restrito povo. Isso é fundamental, porque ortodoxamente Edir Macedo pode andar diariamente de quipá e não se tornará judeu em momento algum.
Dessa aliança única e específica decorrem efeitos tão interessantes quanto terríveis. Tendo os profetas calado-se nos últimos 2000 anos, um colegiado de rabinos assumiu seu lugar e elaborou uma codificação sempre mutável nos aspectos marginais. Isso, o Islã viria a adotar, seiscentos anos depois, de maneira algo similar. Assim, por esta codificação rabínica, que é coerente com a tese da escolha divina do seu povo, coisas estão plenamente autorizadas, tais como matar qualquer outra gente.
A posições são absolutamente inconciliáveis, o que não quer dizer que se deva matar por isso, mas logicamente são coisas excludentes. Não se é cristão e judeu ao mesmo tempo, enfim. Mas, as denominações pentecostais e neo-pentecostais pretendem essa solução de compromisso impossível, o que revela muito de sua falta de densidade intelectual, lógica e teológica.
Há quem veja esse filo-judaísmo como decorrente de interesses pecuniários, apenas. Dia desses, um jornalista escreveu um pequeno texto de inteligência ligeira a defender isto. Para ele, a explicação estaria no comércio intenso de turismo religioso para Israel. Essa hipótese parece-me muito restritiva, porque o dinheiro move muitas coisas, mas não todas. E, principalmente, porque o dinheiro das excursões de fiéis a Israel não é muita coisa.
Talvez haja muito de vontade de afastar-se radicalmente do catolicismo de Roma, mesmo que a preço de cair no vazio lógico e na incoerência flagrante. Realmente, isso de incoerência é próprio das religiões, mas apenas na sua parte axiomática. Esses sistemas tem causas iniciais ou móveis que se podem considerar absurdas, mas daí em diante costumam funcionar coerentemente.
O filo-judaísmo pentecostal e neo-pentecostal é abrir mão de qualquer sentido, pelo que já se disse acima: ou o Messias veio ou está por vir. Não resta, na perspectiva dessas religiões, terceiro possível, nem harmonia das proposições, pois são excludentes.
Para mim, isso tem algo de tentativa de aliança com o mais restrito e forte, além de alinhamento ideológico com a elite do conservadorismo mundial. Grande parte do poder financeiro e bélico do mundo está em mãos da elite judaica. Daí que convém adular esse pessoal e querer parecer-se com eles, mesmo que os emulados intimamente riam-se dessas patetices de quem nunca será o que não nasceu.
Interessante é que isso é por-se em condição subalterna, render homenagem a imitar aquilo que se não é, nem será. Além de ser potencialmente o caminho da dissolução, porque não há perspectivas para novas seitas judáicas…