O homem médio manifesta, relativamente ao tipo superior, ressentimento. E, relativamente ao tipo inferior, manifesta ódio e desprezo. Para os tipos médios, o superior define-se mais intelectualmente que econômica e financeiramente, ao passo que o inferior define-se, basicamente, a partir do ponto de vista sócio-econômico.
No homem médio, o tipo que ele identifica – mesmo irracionalmente, à primeira vista – como superior causa-lhe um mal estar, que é a náusea de perceber algum intelectualismo que ele não alcança e considera, não sem algum acerto, esnobismo.
O tipo inferior, definido quase exclusivamente por parâmetros sócio-econômicos, é aquele que o homem médio gostaria de nem mesmo ser compelido pelo cotidiano a ver. Gostaria que não existisse, pura e simplesmente. Ele é o feio, desprezível, o perdedor que perde por vontade própria, eis que é necessário acreditar em igualdade de oportunidades. É, em suma, o tipo que pede dinheiro porque é preguiçoso, porque poderia estar a trabalhar por um prato de hidrato de carbono.
O ódio e o desprezo do tipo médio pelos inferiores é fenômeno de psicologia de massas de menor complexidade, quando comparado ao ressentimento sentido ante os definidos como superiores.
Como exemplo da primeira inclinação tratada, considere-se a postura que um médio empresário – um construtor civil cumpre a tarefa de caracterizar este tipo social – provavelmente apresentará ante um professor universitário. O médio empresário, no mínimo vinte vezes mais rico que o professor universitário, nutrirá ressentimento frente ao segundo, por sentir-se inferior a ele, mesmo que possua muito mais dinheiro.
Isto não parece surpreendente, quando admitimos que o critério de medida e comparação é, aqui, intelectual. Todavia, a surpresa reside precisamente no fato de o critério não ser puramente financeiro, que é o que se esperaria da proposição teórica dominante aceita pelo homem médio, inclusive.
A despeito de toda ênfase no material, a psicologia de massas implica outras variáveis mais sutis.
É necessário dizer e admitir que as classes dominantes liberais ajudaram muito a criação do homem médio ressentido, por um lado, e enfurecido, por outro. Isto manifesta a degeneração das classes dominantes liberais, pois no após segunda grande guerra elas mostraram-se muito habilidosas em lidar com o homem médio.
Elas deram-lhe a cultura de almanaque, a ciência de almanaque, as popular science e popular mechanics, os Manuais do Escoteiro Mirim, o midcult em humanidades, no modelo do romance exótico de Karl May.
Por meio deste pacote midcult, o tipo médio participava da ciência pelo conhecimento dos processos, mesmo que permanecesse à margem das causas. E, no que concerne às humanidades, sabia, mesmo sem profundidade, que havia grupos humanos diferentes nas longínquas Ásia e África.
Ele tinha um pacote cultural para chamar de seu, com bons vernizes e, embora continuasse a saber que havia uma upper culture, sabia-se de alguma forma inserido. Assim, até sua postura ante o tipo inferior era diferente, pois ela poderia ser parametrizada também culturalmente.
Mas, as classes dominantes liberais sucumbiram ao esnobismo de, mais e mais, ridicularizarem o midcult. E, assim, ajudaram a adubar o meio em que florescem os fascismos, tornando o tipo médio órfão de um pacote cultural para chamar de seu e o impedindo de seguir a definir seu pertencimento a partir de critérios culturais estabelecidos.
Claro que o homem médio ressentido ante o que identifica como superior e odioso ante o que identifica como inferior, buscaria o poder e o obteria, estabelecendo a mediocracia.