Um espaço de convívio entre amigos, que acabou por se tornar um arquivo protegido por um só curador.

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Quando todos são palhaços, ninguém é ridículo.

Depois da guerra de 1939 a 1945, as classes medianas europeias experimentaram uma rápida prosperidade, que foi até meados da década de 1970. Neste período, Deus morreu sua mais recente morte, no ocidente. Esta percepção, colhi-a de um amigo inteligente, a quem devo os créditos, embora não o deva identificar.

Não é extravagante dizer que o niilismo esteve forte a partir dos anos de 1950 e que isto foi bem mostrado no cinema italiano, um cinema que deveria ser mencionado até sem o adjetivo que indica origem. E não apenas no chamado neo-realismo, mas também nas deliciosas comédias.

Há vinte e tantos anos tive um problema que me impediu praticamente de caminhar por quase um mês. Havia, onde vivia, uma boa locadora de filmes e devo ter visto todos os italianos que havia nela. Hoje, vez por outra, vejo-os novamente e percebo algo interessante.

Em muitos realizadores há um efeito que decorre de uma direção política. Não se trata de algo que implique filmes bons ou ruins, por si só. Trata-se de formas de pintar os personagens.

É notável que em realizadores engajados politicamente, como Monicelli, Rossellini, Ponti, De Sica, as personagens dos ricos são ridículas. São ridículas porque são palhaços enquanto as personagens dos pobres não são. O contraste as torna ridículas.

Aprecio muito Fellini e Antonioni e percebo um efeito comum a ambos, que decorre de formas de pintura das personagens diferentes. Nestes dois realizadores, as personagens dos pobres e as dos ricos não são ridículas.

Em Fellini, todos são palhaços, tanto as pobres, quanto as ricas. Se todos são palhaços, ninguém é ridículo. Em Antonioni, ninguém é palhaço e, assim, ninguém é ridículo por efeito de contraste.

Marcello, o jornalista da Doce Vida, é tão palhaço quanto os ricos da festa na suntuosa e antiga Villa. Os fotógrafos de celebridades são palhaços, Emma, esposa de Marcello, é palhaça, assim como Madalena. São todos palhaços e por isso não são ridículos, tanto a plebe, quanto a aristocracia. Fellini produz a imagem dramática, mas não necessariamente ridícula.

Antonioni não usa personagens palhaças e não gera o efeito do ridículo por contraste. Os ricos de Antonioni são tal e qual os ricos são e os pobres idem e os que ascenderam são pessoas que ascenderam e pronto. Suas posições e extrações sociais estão muito claras, mas não sofrem a investida do ridículo.

Fellini é um poeta triste, acho eu. Falo da obra, não da personalidade do realizador, de que não tenho quaisquer condições de falar. A última cena da Doce Vida, com o sorriso cândido da menina a mirar Marcello, é muito dramática.

Antonioni é um cronista, se for válida analogia com literatura. Se há muito do que se chamou psicologismo nos seus filmes dos anos de 1960, é porque havia muito isso na época. Ou seja, havia o mergulho das classes médias e dos ascendentes no niilismo, na incomunicabilidade. Se há muito jazz nos seus filmes desta época, é porque havia muito jazz por toda parte naqueles anos.

Renoir, Fellini e Kubrick disseram quem é e como é a aristocracia ocidental.

Dizer que há um grupo reduzido e interligado de aristocratas que mandam no mundo ocidental – Europa, América do Norte e seus satélites coloniais africanos e sul-americanos – é inconveniente e quase proibido, a depender de quanto explicitamente se fale.

Dos três cineastas do título, é interessante notar que Kubrick foi o mais explícito e, não se sabe se por causa disto, veio a morrer antes do filme ser lançado. Deve ter sido coincidência. Normalmente, os identificados limitam-se a dizer que o identificador é um difusor de teorias da conspiração.

A identificação faz-se a partir da mostra dos códigos que regem as relações dos aristocratas muito ricos entre eles mesmo e entre eles e o restante das pessoas. Tende a escandalizar o público porque estes códigos não se baseiam absolutamente em critérios morais, embora consagrem critérios de honra. E as finalidades destes códigos são ocultar-se e manter o poder nas suas expressões econômica e social.

No seu filme, Renoir insere subtramas e intrigas que afastam um pouco a percepção do que era possível e impossível para a personagem André. em seu romance com a esposa do aristocrata austríaco.

Fellini é discretíssimo. A personagem de Mastroianni, Marcello, percebe na festa no castelo aristocrático romano que ele estava lá apenas fisicamente. Mas, o que parece é ser um filme todo focado na pequeneza existencial de Marcello.

Esses filmes e as identificações dos modos de ser individuais e de grupo dos aristocratas e de seus códigos de condutas para relações internas e externas vieram-me à mente pois lia sobre o marquês Camillo Casati Stampa di Soncino, aristocrata de uma das famílias nobres mais antigas de Itália.

Já havia lido sobre Casati Stampa há muito. Mas, voltei a me interessar porque li que Berlusconi comprou à filha herdeira de Casati Stampa, em 1974, a Villa San Martino. E Berlusconi, farsante e impudico, abriu a Villa a uma equipe de TV para provar que nela não se faziam as festas bunga bunga e para mostrar que havia erigido um mausoléu inspirado no túmulo de Tutancámon, para acolher os amigos que morressem…

O marquês era riquíssimo e tinha muitas casas por toda a Itália. E tinha uma Villa na Ilha de Zannone, que ficou conhecida como a ilha das orgias. Em 1958, Casati Stampa conheceu Anna Fallarino, que fora aspirante a starlet da Cinecittà e findara por casar-se com um engenheiro meio endinheirado, que a inseriu nos círculos de bom gosto romanos.

O marquês conseguiu a anulação do casamento de Anna, mediante pagamento farto, e veio a casar-se com ela em 1959. Na noite do casamento, Anna banhava-se, no hotel em que estavam, e Casati Stampa fez chamar um garçom, um rapaz jovem e bonito, com quem Anna desfrutaria à vontade, enquanto o marido apenas olhava.

Este acordo deu certo. O marquês pagava para jovens, dos dois sexos biológicos, bonitos, de condição social inferior, terem sexo com Anna, enquanto ele tirava fotos. Depois, descobriu-se que havia um arquivo de aproximadamente 1500 fotos encartadas em um diário verde, que trazia também anotações feitas por Casati Stampa.

Havia, porém, um limite estabelecido no pacto: não poderia haver envolvimento emocional nem amoroso entre Anna e os inúmeros amantes pagos pelo marido. Um dia, Anna foi introduzida a um jovem chamado Minorente e envolveu-se afetivamente com ele.

Em agosto de 1970, Casati Stampa matou-os e matou-se com uma espingarda de caça, na sua Villa em Roma. Deixou escrito que havia sido traído com o coração, por Anna. No testamento, estabeleceu que a marquesa Anna seria enterrada junto a ele, no mausoléu da família Casati Stampa di Soncino.

Muitos, notadamente psicólogos, como é intuitivo, debruçaram-se sobre a psiqué do marquês e puseram-se a especular se era impotente, se era voyeur, se era homossexual e por aí vai. Nada disso parece-me importante, eis que tais especulações parecem-me muito mais guiadas por balizas moralizantes que por balizas ou interesses epistemológicos. Claro que a investigação psicológica não é inútil, mas não atinge o mais interessante.

Os móveis psicológicos que impeliam o marquês a tais condutas sexuais não têm a ver com sua origem social e com a possibilidade de fazer o que gostava de fazer. Esta possibilidade concreta de agir abertamente como agia é que é reveladora do que é a classe social a que pertencia.

Há códigos para as relações dos aristocratas muito ricos entre eles e com as restantes pessoas, de fora do grupo. Eles, de uma forma geral, visam à preservação do poder nas suas expressões econômica, social e psicológica. Casati Stampa foi ferido no seu poder pessoal sobre Anna. Foi traído com o coração quando Anna enamorou-se do amante e estabeleceu uma relação que fugia ao poder do marquês.

Este caso é mais sútil, de fato, eis que é mais comum perceber-se a função conservadora dos códigos relativos à liberdade sexual dos aristocratas muito ricos na sua face de manutenção do poder econômico. Na corte dos Aquemênidas, por exemplo, a rainha e as mulheres da alta nobreza serviam-se sexualmente dos eunucos à vontade.

Não havia a interdição sexual na corte persa; havia a interdição de procriar fora do grupo e deslegitimar a nobreza com a geração de bastardos. Os eunucos, contrariamente ao que muitos pensam, não são impotentes quando castrados depois da puberdade, são inférteis apenas.

Semelhantemente acontece com as regras que vedam o acesso dos pequenos fidalgos e do burgueses ao seio da aristocracia muito rica, senão como pequenos bufões que eventualmente divertirão num e noutro jantar, como acontece no episódio da Doce Vida, de Fellini. Mas esse convívio esporádico raramente significa uma aceitação real e um ingresso no outro mundo.

A aristocracia dos muito ricos protege-se, individual e coletivamente, por meio destes códigos desconhecidos da maioria. Assim, mantém riqueza, prestígio social e honra, por bizarro que possa parecer. Nunca se tratará de moral, contudo.

Cinema e Remix…

Ontem, por acaso, estava revendo um filme que vi há uns dois anos atrás.. Princesas, é a estória de uma prostituta espanhola que vive em Madrid, e sua amizade inusitada com outra prostituta, essa, da República Dominicana. O filme é bom, não tem nenhum figurão desses do cinema atual, o diretor não é famoso, ou pelo menos não o suficiente pra ser conhecido aqui pelo Brasil, os atores e atrizes da mesma forma.. Não passou no cinema, e não obstante, o filme é bom..

Por isso mesmo, depois de vê-lo me pus a pensar, por pura falta do que fazer, no cinema americano. Onde são necessários, não apenas grandes nomes artísticos conhecidos, como também grandes produções, muito dinheiro e etc.. E nada, ou quase nada, de criatividade. Segundo informação contida no o pequeno documentário “Everything is a Remix“, 74 das 100 maiores bilheterias dos ultimos 10 anos, são adaptações, de outros filmes, quadrinhos, histórias, e livros. Assim sendo, adaptações de coisas já existentes, algumas vezes até versões Hollywoodianas de filmes já feitos em outros lugares. Não que vá surgir em todo filme a idéia original, mas também não precisa ser tudo a cópia, da cópia da cópia. O Everything is a Remix sobre filmes é o segundo, e vale a pena ser visto:

Por gostar de filmes de super heróis, e esses majoritariamente serem americanos, pra mim, o exemplo clássico é o filme do Hulk, que tem uma versão em 2003, e outra em 2008, são completamente diferentes, muito ruins, como a maioria dos filmes de super hérois que eu gosto, mas não são continuação, não têm coorelação, enfim, são dois filmes do Hulk, com um elenco todo diferente, separados por.. 5 anos??

Com isso na cabeça fui navegar por ai, e encontrei essa série de fotos, de astros o cinema de antigamente e de hoje, onde os rostos se sobrepõe. E percebi que não só os filmes são cópias das cópias, os astros seguem tambem por um linha tênue de semelhança, não sou tão teórico da conspiração a ponto de pensar em clonagem, mas as semelhanças são muitas, e a fama também, é uma pena que a qualidade das películas tenha caido tanto… Mas a admiração é praticamente pelos mesmos rostos, mudam apenas os nomes…

Audrey Hepburn - Natalie Portman

Audrey Hepburn - Natalie Portman

Cary Grant - George Clooney

Cary Grant - George Clooney

Marlyn Monroe - Scarlett Johansson

Marlyn Monroe - Scarlett Johansson

James Dean - Robert Pattinson

James Dean - Robert Pattinson

Elizabeth Taylor - Angelina Jolie

Elizabeth Taylor - Angelina Jolie

 PS1: Os três vídeos da série “Everything is a Remix” são muito interessantes, o primeiro fala de música e se concentra um pouco em cima do Led Zeppelin, o segundo é sobre cinema, e é esse que foi postado, e o terceiro é sobre criatividade.. Os links são primeiro e terceiro.
PS2: O trabalho com as fotos foi desenvolvido por um estudante de arte sueco chamado George Chamoun e chama-se “Iconatomy“.