No século XVI os primeiros portugueses que chegaram à recém descoberta Terra de Santa Cruz trouxeram o arroz vermelho de Cabo Verde e introduziram-no na Bahia. De lá, a variedade foi levada ao Maranhão e, em seguida, a toda a região semi-árida do nordeste do Brasil. É o que se conhece por arroz-da-terra, uma espécie arbustiva, que não se cultiva em alagados.
Posteriormente, o arroz branco tornou-se predominante, pois sua produtividade é maior, desde que se disponha de muita água. Hoje, o arroz-da-terra, o vermelho, é raro; persiste em uma e outra região de cultivos mais rudimentares e tradicionais.
Ele é mais saboroso, os grãos são menores, o tempo de cocção é maior e o volume é nitidamente menor. Depois de vinte e tantos minutos na água fervente, eles se abrem e formam um compacto bloco de arrozes vermelhos e brancos, resultado dos grãos vermelhos dilatados e rompidos ao meio.
Uns sábios, dizem que um francês e um suíço francês, resolveram plantar arroz-da-terra no sertão paraibano. Já produzem bons queijos de coalho de leite de cabra, essa preciosidade que poucos apreciam nestas bandas. Inteligentes, eles cuidaram de embalar o produto discreta e ricamente e desatacaram sua produção orgânica, seja lá o que isso for. Seduziu-me, evidentemente.
Resolvi arriscar a combinação de porco agri-doce com arroz-da-terra, hoje. E resolvi assumir outro risco: isso seria comido com um Chardonnay chileno bem fresco, quase gelado. Convém dizer que todos os Chardonnay chilenos de vinte dólares são bons e alguns esplêndidos.
A princípio, o porco não recomenda um vinho branco gelado. Mas, alguns cuidados podem reduzir essa inadequação. Esse porco tinha pouca gordura e saiu do forno, não de uma frigideira. Estava relativamente leve, macio mas não suculento. Estava mais doce que o ideal, o que inicialmente gerou um pequeno conflito. A doçura, todavia, foi contrariada pelo vinho e o resultado foi agradável.
O arroz-da-terra, depois de muitas adições de água, resultou bom. Ele combinaria melhor com carne assada e vermelha sanguinolenta, mais que com porco ao molho agri-doce. Enfim, a combinação, embora possível, não foi a melhor.
O Chardonnay gelado, senhores sacerdotes do tinto cheio de madeiras, esse não merece qualquer repreensão…
Mdme. Sidarta interessou-se pela sua receita; diz que troca pela receita do Caril de Tia Maria, indiano legitímo e a felicidade dos proctologistas.
Nessa troca, saio eu a ganhar, porque o porco é uma invenção precária, de alquimia de fim-de-semana. E a receita do caril da Tia Maria é de fonte segura e sei que resulta bem!
Meu amigo se este porco for como os demais pratos que fazes nos fins de semana e que tive o privilégio de saborear ,já imagino o resultado e espero ter oportunidade de saborea-lo também.