Essa frase, a do título, exprime uma atitude mental bastante comum. As pessoas confundem a ignorância com a inexistência. Muito embora seja difícil atribuir essa postura somente às conveniências pessoais e sociais, é certo que a auto-justificação desempenha um grande papel nesse engano.
Vejamos o caso brasileiro. Este país tem as maiores desigualdades sócio-econômicas das Américas, medidas pelo índice de Gini. Significa que as distâncias entre os mais ricos e os mais pobres são imensas e, consequentemente, que há demasiados pobres, com tudo que vem a reboque da pobreza.
As pessoas, em geral, não se comprazem com a pobreza alheia, mas não querem vê-la, também. Elas querem estar à vontade para praticar uma indiferença sem culpas. Elas precisam não ver a pobreza, portanto, ou vê-la suficientemente disfarçada, menos escandalosa, menos acusadora. Vê-la, enfim, somente até o ponto de não dar insônia.
Então, criam-se fantasias visuais para diminuir esses contrastes tão agressivos e impudicos. Claro que não se devem reduzir os contrastes a ponto de todos parecerem mais ou menos iguais, senão as identidades sociais terminam por ficar muito tênues e os mais ricos não podem ser identificados. Esse seria o imenso erro e tiraria o emprego de muito colunista social. Há que se buscar o termo razoável, ou seja, algo como o sepulcro caiado, bem apresentável por fora e pútrido por dentro.
Deixemos, contudo, os contrastes de renda que não se querem ver e passemos ao que me chamou a atenção e levou-me a essas divagações. É outra vontade de não ver, outra crença de que o não visto não existe. Muita gente ouviu os lugares comuns das maravilhas tecnológicas, dos auspícios do mercado competitivo e passou a acreditar nisso, cegamente.
Falo de frases feitas como todo mundo está conectado, hoje, todos sabem o que é internet, todos têm acesso à informação na internet e outras cretinices mais. Isso é falso. Acreditar nessa irrealidade pode ser conveniente para quem pretenda negar a falta de êxito na boa e universal prestação desses serviços no Brasil, e também negar sua posição de domínio sócio-econômico numa estrutura excludente.
Reputo grande chatice alinhar números e dados estatísticos, mas aqui não há outra forma de evidenciar as coisas. O Comitê Gestor da Internet no Brasil afirma que: 47% da população nunca usou computador; 55% nunca acessou a internet; 63 milhões de brasileiros estão conectados, de uma população de 190.
Enfim, uma mistura explosiva de burrice com sentimento de culpa leva muitos brasileiros das classes médias e superiores a pensarem que a conexão de internet que têm em casa está em todas as casas. Enfim, consideram existente aquilo cuja inexistência não constataram. Assim, molda-se a realidade por meio do não conhecimento.
Posição muito comoda a de ignorar ,fingir não saber e continuar a vidinha .Quanto ao computador é complicado um mundo conectado com a maioria sem condições desta conecção.
O que não se conhece só denota ignorância. Daí a fazer verdadeiras construções teóricas sobre determinados assuntos..