Sou carnívoro. Mas, a necessidade de variar o paladar, o clima e o fato de que há muitas outras coisas boas além de carnes, levaram-me a pensar uma massa para este quente e seco domingo. E devia ser massa leve, sem carnes no molho.
Os tomates e as folhas de manjericão casam-se tão bem quanto os jovens apaixonados do século XIX, da mesma classe social. O azeite reduz atritos deste matrimônio e a pimenta moída não consegue devolver todo o atrito reduzido pelo azeite. Então, todos estarão presentes.
Era necessário um queijo, para isto tudo ficar um pouco menos vegetariano e ter o sabor que as proteínas animais têm consigo. O óbvio era mussarela de búfala, fresca e ainda muito gordurosa. Todavia, optei por um brie, porque duas vantagens teria: um sabor tantinho mais pronunciado e porque derrete-se mais facilmente e torna as coisas mais untuosas.
Enfim, tomei uma caçarola grande, de fundo grosso de aço, enchi-a quase até às bordas de água, e fogo até levantar fervura. O espaguete seria cozido primeiramente, porque o molho era coisa simplíssima e ainda por outra razão que explico a seguir. Espaguete, convém que seja de bom trigo e, nisso, tudo está resolvido com qualquer desses italianos, mesmo de grandes marcas e comuns, como Barilla.
Sete minutos de cocção a partir da fervura, com punhado de sal e fios de azeite, e o espaguete estava pronto, no ponto certo, meio durinho e solto. Escorre-se o espaguete e deixa-se reservado. Relutei em confessar pequena heresia, mas, afinal, confesso-a: cortei o espaguete a faca, tornando os feixes a metade do seu original. Isso facilitaria a parte final.
Na mesma grande caçarola que cozeu o espaguete – agora vazia e seca da água – pus nove colheres de sopa de azeite e duas de vinagre balsâmico. Não falei acima do vinagre balsâmico porque a idéia ocorreu-me no momento em que deitava o azeite. A narrativa segue a cronologia do preparo, na media do possível e no limite das contradições… Temi pelo acréscimo desse pouco de vinagre, mas ao final resultou bem.
Deixei na caçarola o azeite, o vinagre balsâmico, pimenta moída, um pouquito de sal, e quatro dentes de alho fatiados em pequenas lâminas. Isso ficou na caçarola uns vinte ou trinta minutos, enquanto cortava os tomates e retirava as folhas do raminho de manjericão.
Acendi o fogo no mais elevado e não deixei de mexer um momento. Estava em jogo reduzir um pouco o azeite misturado ao vinagre balsâmico e deixar o alho soltar sua natureza álhea, o que faz melhor quando toma calor no azeite esquentando com ele e não chegando a fritar. São coisas bem diversas por alho no azeite quentíssimo e esquentar alho e azeite ao mesmo tempo.
Isso de azeite, vinagre balsâmico, alho e pimenta moída foi mexido por dois minutos, no máximo, e a seguir deitei os tomates. Devo dizer que não cortei os tomates em cubinhos muito pequeninos, como é de meu hábito. Cortei-os em pedaços rectangulares, de mais ou menos três centímetros por meio centímetro. Não queria ser perguntado por que este formato, apenas sei que os queria maiores que os cubinhos.
Nessa altura em que entram os tomates, não se deve parar de mexer, de saltear, nem um minuto. Nem se deve tampar a caçarola. Pouco depois que os tomates começam a deitar sua água, põem-se as folhas de manjericão, sempre revirando tudo. Passados, uns cinco minutos disso de mexer tomates que se vão escurecendo pela influência do pouco de vinagre balsâmico, deitam-se os pedaços de queijo brie.
Pouquinho tempo, coisa de dez, vinte segundos após a queda dos cubos de brie nesta mistura quentíssima, deita-se o espaguete que, como disse não sem alguma vergonha, havia sido partido ao meio. Agora é saltear, com colher de pau grande. Saltear é fazer saltar e misturar-se e não deixar pegar ao fundo e às bordas da caçarola quente, é mais que mexer.
É claro que se tivesse uma frigideira grande o suficiente teria salteado nela. E digo isso para não escandalizar nem induzir a suposição de ignorância muito grande que pode insinuar-se no improvável leitor que cozinhe. Saltear numa caçarola não é tanto impossível quanto difícil…
Dois minutos depois, põe-se nos pratos e come-se. Mesmo com temperatura muito alta, um tinto com pouca madeira e bem fresco é melhor que cerveja para acompanhar esta massa. Qualquer chileno de uvas Carmenère que não tenha feito estágio em carvalhos franceses e norte-americanos por mais de seis meses acompanha bem. Esses têm mais vivacidade e frutas que madeira e fumo.
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