Um espaço de convívio entre amigos, que acabou por se tornar um arquivo protegido por um só curador.

Escravos dos bancos deviam perceber que a realidade desmente o discurso. Ou, cliente falido não compra!

Nesses tempos de crises financeiras divulga-se que todos devem prestar culto ao ajuste fiscal, à redução das despesas do Estado, à elevação das idades de reforma, à redução das ajudas sociais, à austeridade, de forma geral. Ninguém, por outro lado, deve ousar lembrar-se que os bancos foram salvos da falência com dinheiro de todos, tomado compulsoriamente, por meio de impostos, pelos Estados.

Principalmente, ninguém deve aproximar-se da compreensão de que os Estados estão a agir como prepostos dos bancos e, não dos povos  que elegeram os agentes políticos. Todavia, a coisa é acacianamente simples e por isso mesmo enseja uma campanha mediática robusta, para afastar qualquer tentativa de pensamento claro.

Convém-nos pensar em que consiste uma falência bancária. O maior problema – dirão todos – são os depósitos dos correntistas e isso é absolutamente verdadeiro. Então, a motivação principal de evitar-se uma falência bancária é proteger os dinheiros das pessoas que os entregaram ao banco.

O erro – ou o assalto – insere-se precisamente na forma de defender os tais depósitos. Ora, toda teoria de mercados indica que as intermediações encarecem as transações. Fica óbvio que se o interesse primordial são os correntistas, a melhor forma de salvamento é pagar-lhes diretamente. Pagar ao banco para que este possa pagar ao correntista é, sem juízos de valor, a pior maneira de salvamento.

Se os governos são levados a tomarem as medidas piores e mais caras, deve-se investigar o que os fez agir assim. Quem pensar em comissões passadas de bancos para governantes estará no bom caminho investigativo. Há um íntimo contubérnio entre banqueiros e políticos governantes, em detrimento das maiorias.

É interessante notar que as teses do pessoal das finanças – banqueiros privados, FMI, monsieur Strauss-Kahn – são desmentidas pela realidade. Eles dizem e repetem à exaustão que países com riscos de dívidas devem adotar ajustes rigorosíssimos para recobrarem a confiança de quem lhes empresta dinheiro.

Mas, fato curioso, a Irlanda seguiu à risca os conselhos de adotar uma rigorosa austeridade. Adiantou-se a mostrar bom comportamento frente aos bancos, cortou imensamente despesas sociais e, a despeito de tanta obediência, não viu os juros de seus títulos caírem!

A Islândia, por outro lado, reagiu de maneira diversa. Depois de ir à falência financeira, banqueiros foram presos, o governo novo de centro-esquerda deu calote nos bancos e o que aconteceu? Recupera-se melhor que a Irlanda, que seguiu à risca a cartilha financista.

Atualmente, na Europa, esse receituário de austeridade de gastos sociais tem sua entusiástica origem na Alemanha. Não sou economista, mas creio que a postura alemã precipitará a Europa em um abismo. Eles querem defender a moeda comum, o euro, que é o marco alemão com algumas pitadas de franco francês. Querem defendê-lo porque seus bancos emprestaram em valores denominados em euros e porque convém ter compradores de produtos alemães aptos a pagarem em euros.

Todavia, o garrote financeiro nos vizinhos mais pobres pode ser ruim para a Alemanha. Ora, embora a indústria alemã seja bastante pujante, não é mais competitiva que a do sudeste asiático. O grande mercado das exportações alemãs é a Europa e os produtos germânicos, por melhores que sejam, não têm condições de invadirem o restante do mundo. Os chineses têm!

Evidencia-se o paradoxo. De que servirá empobrecer o restante da Europa em benefício dos bancos alemães, se isso prejudicará a própria indústria alemã? Se este fosse um país naturalmente rico, ou seja, rico em petróleo ou em outros minérios, seria perfeitamente compreensível tal estratégia. Mas, não é o caso. Trata-se de uma riqueza de base industrial que, inclusive, antecede à bancária.

De quê servirá à Europa – e à Alemanha – ficar com o euro se faltarem euros na Grécia, na Espanha, em Portugal, para se comprarem os desejados BMW? Ou alguém acha possível inundar a Índia de BMWs de 50.000 euros? De minha parte, acho complicada uma expectativa dessas.

Embora seja anátema falar-se em saída do euro, está claro que essa possibilidade cresce dia-a-dia. Inclusive, a evidência de que tal saída tem sido cogitada encontra-se nas garantias enfáticas de que não acontecerá. Na fala recente de Cavaco Silva a assegurar que não há hipótese de Portugal voltar aos escudos vê-se o quanto essa mesma possibilidade aproxima-se. porque ninguém se põe a negar enfaticamente alguma coisa absolutamente impossível.

A riqueza muita vez conduz à perda da habilidade persuasiva. Isso parece ocorrer com a Alemanha, atualmente. A ela convém que permaneça o euro e, portanto, convém que se esforce para convencer os mais pobres a mantê-lo. Todavia, age como se isso fosse uma verdade absoluta e indiscutível, projetando para outros o que é válido para ela. Então, age com arrogância, reputando tolas quaisquer considerações quanto ao assunto que não sejam aquelas estritamente alinhadas às suas verdades.

Um e outro recuo foi obtido com sérias ameaças francesas de rompimento com a moeda única, porque a economia francesa é bastante grande, embora menor que a tedesca. Todavia, com parceiros europeus de economias menores agem imperialmente e consideram qualquer reclamação como birra de crianças mal acostumadas. Isso tem precedentes históricos demasiado conhecidos…

2 Comments

  1. Julinho da Adelaide

    Esse parece ser desses casos onde o interesse de algumas corporações se sobrepõem ao interesse do Estado. Acontece com frequencia, azeitados por muita propina. Para que se viabilizem precisam de um regime de força ou a combinação de muita lavagem cerebral na academia e na mídia, e de um povo pouco esclarecido para não saber o que quer do Estado.

  2. Andrei Barros Correia

    Muita lavagem cerebral na academia e na mídia e um povo pouco esclarecido.

    É precisamente isso que acontece, Julinho.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *