A academia não me surpreende e isso deve-se mais a ter a surpresa como item raro nas ementas que se servem. Esclarecido, portanto, que não se deve à incapacidade da academia.
Fato é que ainda discutem o que não leram e afinal não perceberam. E cultivam certas coisas somente como objetos de museologia científica, como objetos de um tributo a ser necessariamente prestado.
Ética é um nome para codificação normativa; um nome, afinal, como qualquer outro, pois servem código, diploma, lei, decreto e muitos mais. Isto, digo-o sem ofender o alemão que relacionou ética protestante com capitalismo, porque isto disse-o ele.
Esta ligação entre ética protestante e capitalismo é como uma reivindicação pela reforma – talvez mais precisamente pelo calvinismo – da invenção da máquina a vapor. Justa reivindicação, na medida em que se limite a argumentar com o tempo cronológico e com o espaço geográfico físico.
Para mais que isso, quer dizer nada ou quase nada. Não há, como parece emergir da obra tão fincada no seu tempo de nascimento, relação de necessidade entre a ética e o espírito, substantivos merecedores dos adjetivos marcantes.
Curioso é que, hoje, afirme-se a relação intrínseca entre os adjetivos, mesmo que tenhamos toda a Ásia a desmentir esta superficialidade. Esta imensa e pujante Ásia tem um adjetivo na ausência do outro.
O capitalismo floresceu e floresce na Ásia sem o adubo que se acreditava inseparável: a ética calvinista. Escândalo supremo para quem se ponha a pensar, mas um nada silencioso de repetição para tantos acadêmicos que repetem o alemão sem terem percebido seu caráter de propaganda e de preso do tempo.
O capitalismo, em verdade, não precisa de ética, neste sentido meio piedoso, vulgar e pequeno burguês que se emprestou ao termo. Ele vive melhor na ausência de qualquer codificação para ele, embora não viva bem na ausência de alguma codificação para disciplinar o povo, qualquer que seja.
Extraordinário é ver que presunção – ou ingenuidade – conduziu o cientista social que quis ver a relação necessária entre ética calvinista e o florescimento do espírito – geist – capitalista. Primeiro, ele estabelece data de nascimento do capitalismo, como se acumulação fosse algo de ontem ou antes de ontem.
Segundo, põe-se como profeta a dizer que a morte de um seria a do outro, ou seja, ele fala para o futuro sem perceber o presente, porque a Ásia de hoje estava na de ontem, bastando-lhe livrar-se dos ingleses.
Esse seu texto está muito preciso e elegante ;infelizmente a distribuição de probabilidades dos que lêem e têm a oportunidade de se libertar do refúgio na ignorância é fortemente assimétrica para um lado , com a área sob a curva da densidade de probabidades dominada por uma muito maior participação do lado dos obliterados, dos aproveitadores e dos inocentes úteis.