Em 1979, os norte-americanos começaram a temer que a virada autonômica sucedida no Irã se espalhasse por todo o médio oriente e norte da África. Temor um pouco explicado pela insistente ignorância de que a Pérsia não tem nada a ver com a arábia, excepto pelo islamismo. Pode ser difícil de acreditar, mas a diplomacia norte-americana costuma ser ignorante, talvez por excesso de confiança.
O fato é que temiam um aumento grande dos preços do óleo cru, além da dificuldade de explorá-lo a partir de suas próprias companhias. Tinham na memória as nacionalização de Mosaddegh, algo que os tinha obrigado a promover um golpe e patrocinar o Xá Phalavi, um usurpador dócil às Shell e British Petroleum da vida.
Quando os problemas circunscreviam-se à Península Arábica, ao Magreb e à Cirenaica, era mais fácil de resolver, bastanto, muitas vezes, chamar a aviação israelense. Mas, com o Irã, era diferente.
Partiram para uma tentativa óbvia: armar o Iraque, por a soldo o chefe sunita Hussein, e manda-lo incomodar o Irã com uma guerra totalmente sem sentido para os guerreantes. A guerra custou caríssimo, mas não resultou no desejado, ou seja, não conseguiu levar o Irã à falência e à sucessiva ocupação ocidental.
O chefe sunita Hussein, certo de ter tentado cumprir sua missão e de contar com alguma solidariedade dos seus chefes, parou um pouco de ser instrumento e foi cuidar de governar seu feudo babilônico. Deve ter percebido que, para agradar minimamente os súditos, precisava desagradar também minimamente as companhias petroleiras estrangeiras.
Os EUA e seus acompanhantes europeus não podiam descuidar de um assunto tão importante quanto o preço do óleo combustível. Organizaram um grande bombardeio e, alguns anos depois, uma invasão militar. Ocuparam o Iraque, militarmente, destruíram sua infra-estrutura, dissolveram a precária arrumação de forças que lá havia e escolheram outros bandidos para comporem um governo de farsa.
Criou-se demanda para as indústrias bélica, de construções, de fornecimento de mercenários e, principalmente, garantiu-se abastecimento de óleo.
Hoje ou, melhor dizendo, antes do bombardeio da Líbia, vinham de lá 15% do petróleo consumido na França. É uma parcela muito significativa, o que explica a avidez gaulesa em agredir a Tripolitânia e a Cirenaica. Esse fornecimento não estava ameaçado, porque o regime conduzido por Gaddafi havia-se articulado aos interesses das petroleiras.
Acontece que outros países norte-africanos e árabes viviam revoltas populares contra governos absolutamente vendidos e dóceis aos interesses ocidentais. E, por outro lado, absolutamente contrários às maiorias de suas populações. Era a perfeição de um neocolonialismo sem tropas de ocupação. Bastavam algumas famílias de saqueadores locais e as companhias européias e norte-americanas, com livre trânsito.
A Líbia, embora Gaddafi tenha-se transmutado de cão louco em sábio amigo, revelou-se o objetivo ideal de uma ação exemplar. Precisamente onde os indicadores sociais eram os melhores e a população a mais rica dos Estados Norte-Africanos. Precisamente onde jorra o petróleo mais leve e mais fácil de ser refinado.
Aqueles a quem chamam rebeldes são uma gente que não gosta de Gaddafi, mas tampouco quer, em sua maioria, ser escrava de franceses, ingleses e norte-americanos, como simples instrumentos de um saque a recursos naturais. Apenas subornando-os e dando-lhes armas, não será suficiente para obter-se o país.
Terão que invadí-lo, ou seja, fazer da forma mais cara o que já funcionava da mais barata. O momento crucial deu-se quando Gaddafi, pressionado, disse que venderia seu óleo apenas a chineses e russos. Daí surgiu toda a bravura francesa na defesa dos interesses humanitários de meia dúzia.
Esse mapa acima, da divisão do saque ao Iraque, já está pronto para a Líbia. Nele, certamente a Total tem um quinhão maior, na proporção de quantas bombas e quantos Rafales as despejaram na Cirenaica. Assim são as ações humanitárias aprovadas pela ONU. Quer isso dizer que o petróleo humanizou-se?
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