Um espaço de convívio entre amigos, que acabou por se tornar um arquivo protegido por um só curador.

Categoria: Um texto (Page 9 of 10)

José Serra e o capitalismo à brasileira: as privatizações de 1994 a 2002.

Como é bom fazer aquilo em que se acredita.

Um texto de Andrei Barros Correia

Imagens são fantasticamente reveladoras. O ânimo de quem faz aquilo em que acredita dificilmente é escamoteado em uma fotografia. Nesta, por exemplo, vê-se José Serra sorrindo muito sinceramente – esse sorriso é o máximo a que ele chega em efusão – no leilão de privatização da companhia de distribuição de energia elétrica do Estado do Espírito Santo, a Escelsa, em 1995.

Anunciava-se a redenção dos males do país com a privatização de tudo quanto fosse vendável. No caso da energia elétrica, privatizaram as distribuidoras, desmontaram o planejamento estatal que, mal ou bem fazia planos, e impuseram uma política de contenção de investimentos às geradoras, que não foram vendidas.

O resultado foi um imenso racionamento de energia elétrica, popularmente chamado apagão, sucedido em 2001 e 2002, os dois últimos anos do governo do doutor – sim, com doutoramentos mesmo – Fernando Henrique Cardoso. Como se sabe, energia elétrica é o insumo mais importante para o crescimento econômico e pode-se perceber as consequências trágicas de dois anos de escassez.

As privatizações, assim como as estatizações, em si, não constituem males nem bens. O problema são suas razões, suas oportunidades, a existência real de regulações e a propaganda. O pessoal do Presidente Fernando Henrique Cardoso assumiu um tremendo risco político anunciando as privatizações como uma salvação, uma coisa de caráter redentor, a entrada no perfeito mundo dos serviços bons e baratos.

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Deputada Cida Campos em bom momento.

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Vale a pena ver esse vídeo. A Deputada da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro Cida Campos fala a propósito de um deputado que pretende ser indicado para O Tribunal de Contas (ou seria de faz-de-contas?). Fala em termos claros, sem eufemismos, para silêncio e constrangimento geral dos deputados presentes. Chama o pretendente de ladrão de dinheiros públicos, aponta inquérito e processo em isso foi apurado e pergunta se uma pessoa dessas preenche o requisito da reputação ilibada. É devastador, mas começo a crer que o pretendente está bem habilitado para o tribunal.

Farisaísmo pequeno-burguês.

Os indivíduos de extração aristocrática não fornecem os melhores exemplos de farisaísmo. Oferecem, claro, os melhores retratos de decadentismo, de certo anacronismo e, geralmente, de indiferença. Como o termo aristocrata, hoje, é muito impreciso, e mesmo impróprio, ele pode ser indutor de confusão. Basta lembra que é corrente tomá-lo por sinónimo de rico, o que não está conforme às suas raízes históricas.

Pode-se reter do significado original algo aproximado a um estoicismo de intelectuais de relativas posses. Fica evidente , então, que remanesce somente a palavra, utilizada para denominar os mais ricos que têm algum gosto. Para o que se aborda, essa delimitação deve bastar, porque a intenção é apontar dois grupos sociais e evidenciar um comportamento mais associado a um deles que a outro.

A pequena introdução justifica-se pela dificuldade de distinguir grupos sociais por critérios mais abrangentes que a mera detenção de um nível de renda. Por esse último critério, é bastante fácil estratificar as pessoas em classes A, B, C, E e até ao infinito. Todavia, das classificações essa é a menos precisa para revelar formas de pensar e para estabelecer identificações recíprocas. Um milionário e um médio-classista podem estar muito mais próximos ideológica e comportamentalmente do que suas diferenças de fortuna permitem supor.

Aceitemos, então, que aristocrata e pequeno-burguês são termos que designam grupos sociais. Insisto, sociais, não necessariamente econômicos. Os primeiros – sejam decadentes, sejam delinquentes, sejam o que forem – não esperam aceitação, nem afirmam a diferença, simplesmente crêem que ela existe. Isso é a matriz da arrogância, que em sociedades de massa engendra a degeneração da indiferença, fermentada na ignorância. Como não têm, em sua vasta maioria, reais méritos, são um simulacro. Mas, uma coisa é certa, não carregam culpas e são subjetivamente passivos.

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Liga dos Campeões: arrogância futebolística britânica deve ser repensada.

As finais da Liga dos Campeões envolverão o espetacular Barcelona, a Inter de Milão, o Lyon e o Bayern de Munique. Os britânicos Manchester e Arsenal foram eliminados, respectivamente, pelos alemães e pelos catalães.

Isso é interessante porque há mais ou menos vinte anos as equipes britânicas subiram a um patamar de dispêndios e de auto-confiança que apenas a reciclagem dos dinheiros da máfia russa podiam autorizar. Lembro-me quando as equipes inglesas adquiriram quase todos os futebolistas bons que havia na França. Depois, estenderam o furor aquisitivo sem quaisquer fronteiras.

Isso foi acompanhado pela crença generalizada de que eram equipes infalíveis, por conta de seu potencial econômico. Idéia fácil de vicejar, já que a moda é achar que tudo se resume a dinheiro. Não obstante todo esse dinheiro, eis que o encanto começa a desfazer-se e surgem, inclusive, indícios de que essas equipes não têm as contabilidades mais saudáveis do mundo.

Mas, coitados, sem dinheiro e só com britânicos a jogar, vai ser mesmo difícil para os súditos de Elisabete II.

Binyamin Netanyahu é bastante sincero.

Se eu me esquecer de ti, Jerusalém,

que me seque a mão direita!

Que me cole a língua ao paladar,

caso eu não me lembre de ti,

caso eu não eleve Jerusalém

ao topo da minha alegria!

Salmo 137: 5-6

Um sionista de verdade é muito melhor que todos os dissimulados. Põe em cheque os seus funcionários na Casa Branca, que gostariam dos habituais discursos apaziguadores.

Pois o Primeiro Ministro de Israel, Binyamin Netanyahu disse, sem meias palavras, que Jerusalém não é um assentamento, é a capital de Israel. Disse-o como a rechaçar toda a pressão que sofre por conta dos mais recentes capítulos da contínua violência israelense nos territórios palestinos. Disse, enfim, que não há limites.

Ele foi ao ponto. O que se fez na modalidade de Josué, far-se-á de qualquer maneira e o recurso à violência é desprezível. Não há recuos possíveis, embora tenha havido décadas de discursos sobre os recuos estratégicos.

A Casa Branca fará de conta que não entendeu?

Uma mesa de bar e a Academia.

Um texto de Ubiratan Câmara Queiroz

Mais aprendi em uma mesa de bar do que na própria Academia. Tal assertiva é verdadeira, constatada a partir de reiteradas análises empíricas dos campos de conhecimento humano em que me aventurei.

Justifico a proposição, antes que as cruzes e os pregos da autoreferência acadêmica crucifiquem a vulgaridade do meu ébrio proselitismo.

O pouco que aprendi na Academia foi melhorado após leituras de um ou dois superficiais manuais de vanguarda, os mesmos que edificaram a pedante sapiência dos mestres, embora nada sejam além de traduções de pensamentos europeus, em sua maioria.

O âmbito acadêmico motivou, por outro lado, uma restrita, mas valorosa, coleção de amigos, em virtude de sentimentos de estima iniciados pelo acaso físico-temporal da convivência instituída.

Amigos estes capazes de fomentar a mais fértil e ousada interdisciplinaridade, no palco das discussões de uma mesa de bar, onde não mais há a sobreposição física ou hierárquica curricular, pois todos permanecem igual e horizontalmente distribuídos. Há, sim – como diferente não poderia ser – o respeito ao conhecimento alheio, que, ao fim, contribui no crescimento particular, na exata proporção que a ignorância pessoal admite.

No último encontro, sem qualquer presságio, Zorba o Grego se fez presente, a cegueira ensaiada também. Ortega discutiu com Vidal. Questionou-se a veracidade da presença de Amália Rodrigues na Serra da Borborema. Vinicius, o poeta e diplomata, tornou-se profeta, e tome gravata! A fadista ainda o recebeu em um sarau particular em 1970. Marcelo Nova parodiou Sinatra. Criticou-se o laconismo inglês, na mesma proporção em que histórias com outros anfitriões europeus foram enaltecidas, ao som de Take Five. Cake, por sua vez, se saiu melhor do que Gloria Gaynor. Os serviços públicos, a patifaria tupiniquim de toda sorte e o tecnicismo jurídico foram abordados… em algum momento o nível haveria de regredir, afinal.

A própria percepção de tempo foi maculada, talvez pela majoração individual dos níveis etílicos ou, quem sabe, pela qualidade, pura e simples, do aprendizado, que apenas foi obstado pela carência alimentar do dileto felino de um dos interlocutores.

A noite se prolongou agradável e saborosamente… de sorte que a Academia se tornou uma breve e distante lembrança.

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