Um espaço de convívio entre amigos, que acabou por se tornar um arquivo protegido por um só curador.

Categoria: Poesia (Page 5 of 6)

Olhe aqui Mr. Buster.

Olhe aqui, Mr. Buster: está muito certo
Que o Sr. tenha um apartamento em Park Avenue e uma casa em Beverly Hills.
Está muito certo que em seu apartamento de Park Avenue
O Sr. tenha um caco de friso do Partenon, e no quintal de sua casa em Hollywood
Um poço de petróleo trabalhando de dia para lhe dar dinheiro e de noite para lhe dar insônia
Está muito certo que em ambas as residências
O Sr. tenha geladeiras gigantescas capazes de conservar o seu preconceito racial
Por muitos anos a vir, e vacuum-cleaners com mais chupo
Que um beijo de Marilyn Monroe, e máquinas de lavar
Capazes de apagar a mancha de seu desgosto de ter posto tanto dinheiro em vão na guerra da
Coréia.
Está certo que em sua mesa as torradas saltem nervosamente de torradeiras automáticas
E suas portas se abram com célula fotelétrica. Está muito certo
Que o Sr. tenha cinema em casa para os meninos verem filmes de mocinho
Isto sem falar nos quatro aparelhos de televisão e na fabulosa hi-fi
Com alto-falantes espalhados por todos os andares, inclusive nos banheiros.
Está muito certo que a Sra. Buster seja citada uma vez por mês por Elsa Maxwell
E tenha dois psiquiatras: um em Nova York, outro em Los Angeles, para as duas “estações” do
ano.
Está tudo muito certo, Mr. Buster ? o Sr. ainda acabará governador do seu estado
E sem dúvida presidente de muitas companhias de petróleo, aço e consciências enlatadas.
Mas me diga uma coisa, Mr. Buster
Me diga sinceramente uma coisa, Mr. Buster:
O Sr. sabe lá o que é um choro de Pixinguinha?
O Sr. sabe lá o que é ter uma jabuticabeira no quintal?
O Sr. sabe lá o que é torcer pelo Botafogo?

Olha aqui Mr. Buster, de Vinícius de Moraes. Essa é espetacular.

[youtube=http://www.youtube.com/watch?v=z-xxy9_8duM&hl=pt_PT&fs=1&]

Mandou-me o vídeo o meu estimado Ubiratan. É uma curta poesia de Vinicius, a propósito da incompreensão de um certo Mr. Buster. Esse camarada não entendia como Vinícius, então cônsul brasileiro em Los Angeles, queria voltar para o Brasil. Os norte-americanos são assim, arrogantes a ponto de serem cegos, totalmente cegos. Aí o mundo muda e eles ficam com raiva porque não perceberam, nem foram avisados. E se fossem não compreenderiam…

É de escutar-se com atenção.

Recife, por Capiba e Chico Buarque.

[youtube=http://www.youtube.com/watch?v=VqyCuQ-PoIU&color1=0xb1b1b1&color2=0xd0d0d0&hl=pt_BR&feature=player_embedded&fs=1]

Lindo. Vi no blog do Nassif e apressei-me a por aqui.

Responde ao que vou perguntar
O que é feito dos teus lampiões
Onde outrora os boêmios cantavam
Suas lindas canções…

É impressionante. Vendo as fotografias do Recife dos anos 60, só me lembrava das fotografia de Maputo – então Lourenço Marques – que passei muitos minutos a ver, em um livro que não lembro o nome, na Fnac de Braga!

Vou-me embora pra Pasárgada, de Manuel Bandeira.

A infância e os sítios dela deviam ser tempo e locais de sonho para um grande poeta que a tuberculose destruía lentamente.

Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive

E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d’água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada

Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.

Habeas Pinho, de Ronaldo Cunha Lima. O poeta só poetando.

Ronaldo Cunha Lima é um político paraibano, originário de Campina Grande. Mas, não é de política que se fala aqui, é de poesia. Porque ele também faz versos, inspirados nas motivações populares e regionais. O poeta poetando é melhor que o político politicando.

Conta-se que, um dia, ou uma noite, reuniam-se boêmios campinenses em torno de canções, bebida e um violão. Por alguma razão, achou-se que o convescote ofendia moralidades silenciosas e os cantadores e o violão foram presos. Os trovadores populares obtiveram a liberdade rapidamente, mas o pobre instrumento de cordas permaneceu detido!

Ronaldo, então, interpôs a famosa ação judicial liberatória, em favor do violão, e o fez em versos, chamando-a de Habeas Pinho. É inegavelmente bela, essa trova de inspiração singela. O violão foi solto, por um juiz também poético.

Senhor Juiz.
Roberto Pessoa de Sousa

O instrumento do “crime”que se arrola
Nesse processo de contravenção
Não é faca, revolver ou pistola,
Simplesmente, Doutor, é um violão.

Um violão, doutor, que em verdade
Não feriu nem matou um cidadão
Feriu, sim, mas a sensibilidade
De quem o ouviu vibrar na solidão.

O violão é sempre uma ternura,
Instrumento de amor e de saudade
O crime a ele nunca se mistura
Entre ambos inexiste afinidade.

O violão é próprio dos cantores
Dos menestréis de alma enternecida
Que cantam mágoas que povoam  a vida
E sufocam as suas próprias dores.

O violão é música e é canção
É sentimento, é vida, é alegria
É pureza e é néctar que extasia
É adorno espiritual do coração.

Seu viver, como o nosso, é transitório.
Mas seu destino, não, se perpetua.
Ele nasceu para cantar na rua
E não para ser arquivo de Cartório.

Ele, Doutor, que suave lenitivo
Para a alma da noite em solidão,
Não se adapta, jamais, em um arquivo
Sem gemer sua prima e seu bordão

Mande entregá-lo, pelo amor da noite
Que se sente vazia em suas horas,
Para que volte a sentir o terno acoite
De suas cordas finas e sonoras.

Liberte o violão, Doutor Juiz,
Em nome da Justiça e do Direito.
É crime, porventura, o infeliz
Cantar as mágoas que lhe enchem o peito?

Será crime, afinal, será pecado,
Será delito de tão vis horrores,
Perambular na rua um desgraçado
Derramando nas praças suas dores?

Mande, pois, libertá-lo da agonia
(a consciência assim nos insinua)
Não sufoque o cantar que vem da rua,
Que vem da noite para saudar o dia.

É o apelo que aqui lhe dirigimos,
Na certeza do seu acolhimento
Juntada desta aos autos nós pedimos
E pedimos, enfim, deferimento.

Continue reading

Zorba, o grego, dança!

[youtube=http://www.youtube.com/watch?v=2AzpHvLWFUM&hl=pt_PT&fs=1&]

– … Se eu tiver vontade, você sabe, só se eu tiver vontade. Trabalhar para você está certo, quando quiser. Sou homem seu. Mas o santuri é diferente. É um animal selvagem e precisa de liberdade. Se eu tiver vontade, eu toco e chegarei mesmo a dançar. E dançarei o zeimbekiko, o hassapiko, o pendozali – mas, digo desde logo, só se eu tiver vontade. Bons entendimentos fazem bons amigos. Se você me forçar, acabou-se. Para essas coisas, é preciso que você saiba, sou um homem.

– Um homem? O que quer dizer com isso?

– Pois bem, livre!

Soneto de Teresa D´Ávila.

Eros e Tánatos na mísitca de uma poetisa castelhana, religiosa católica do século XVI. Uma grande poetisa, diga-se.

Al Cristo Crucificado

No me mueve, mi Dios, para quererte
el cielo que me tienes prometido,
ni me mueve el infierno tan temido
para dejar por eso de ofenderte.

Tú me mueves, Señor, muéveme el verte
clavado en una cruz y escarnecido,
muéveme ver tu cuerpo tan herido,
muévenme tus afrentas y tu muerte.

Muéveme, en fin, tu amor, y en tal manera,
que aunque no hubiera cielo, yo te amara,
y aunque no hubiera infierno, te temiera.

No me tienes que dar porque te quiera,
pues aunque lo que espero no esperara,
lo mismo que te quiero te quisiera.

« Older posts Newer posts »