A burrice é a força mais intensa e mais perigosa de quantas agem sobre as pessoas. Convém não confundir burrice com má-fé, que embora sejam coisas muito distintas, geralmente são tomadas na conta da mesma e única motivação de alguma ações.
Ela também não se confunde com a assunção consciente de riscos, situação em que o efeito indesejável era razoavelmente previsível, mas houve a tomada dos riscos. Aqui, há manifestação de vontade a saber que consequências ruins podem ocorrer.
A burrice aparenta-se um tanto ao desleixo, à falta de cuidado, à despreocupação com o que pode resultar. Enfim, a despreocupação com resultados e a burrice interpenetram-se, como se fossem reciprocamente causa e efeito uma de outra, sucessivamente.
O caso é que a obra de reforma feita na casa onde fica o órgão em que trabalho resultou na colocação de um tipo de revestimento cerâmico na calçada em frente que é quase como azulejos. Estes, como todos sabem, são muito lisos e quase não apresentam atritos. Molhados, são a superfície ideal para escorregões.
Ia eu saindo do trabalho, na última sexta-feira, e chovia. Desci as escadas e cheguei à calçada, caminhando para o carro. Na esquina, escorreguei e levei um tombo imenso. Um dos pés subiu e o outro ficou mais firme no chão. Cai de lado já sentindo dores fortíssimas e um estalo que me fez pensar na ruptura de todos os ligamentos do pé ao tornozelo.
Consegui levantar-me agarrando-me às grades, com uma dor de fazer gritar. Quando ergui-me, tentei pisar o pé que doia – para saber se o desgraçado havia quebrado. Mal botei o pé no chão e quase caio mais uma vez. Arrastei-me para o carro, entrei e sentei, esperando passar o pior da dor. Demorou.
Consegui dirigir até em casa, com uma torção no tornozelo. Ainda agora estão o pé e o tornozelo bastante inchados e doloridos, mas deve passar logo.
Se fosse uma velha ou um velho – ou pessoa de qualquer outra idade que caísse de pior jeito – podia dar-se muito mal. E isso porque algum ou vários estúpidos puseram no chão um piso que é quase de azulejos. Podiam tê-lo feito de cimento – que era até mais barato – ou de pedras ou de qualquer outra coisa.
Claro que os fulanos autores dessa obra não estavam premeditando quedas em dias de chuva. Eles simplesmente não pensaram em coisa alguma, não consideraram as possibilidades, agiram a partir de critérios de moda, ou a partir de critério nenhum. Também não se pode dizer que assumiram riscos, que não devem ter pensado em risco algum.
Assim se produzem os piores males, porque essa motivação percebe-se desde a colocação de azulejos no chão ao vôo de um avião com defeitos. Não se trata de opção consciente por algo que traz alguma recompensa mas pode trazer algum prejuízo. Trata-se de fazer por fazer, sem consideração alguma.
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