Um espaço de convívio entre amigos, que acabou por se tornar um arquivo protegido por um só curador.

Arrogância e heresia. Por que o Nazareno precisa ser contra Iemanjá?

Houve um grande encontro de adeptos do cristianismo reformado, em Campina Grande. Não sei se todas as denominações estavam representadas, mas acho difícil, pois são muitas e continuamente surgem novas variantes. É um modelo permanentemente cismático e pulverizado.

Nessas grandes ocasiões sempre se reproduzem variações de alguma idéia central. E, os monoteísmos de raiz mosaica derivam suas doutrinas da exclusividade de seu deus. Se o deus do deserto palestino contentava-se em opor-se aos outros deuses, o de agora está bem certo de não haver outros e requer dos seus prosélitos que afirmem essa exclusividade à exaustão.

Leio, em um qualquer jornal, que um qualquer pastor volta suas armas e sua pobre retórica contra a religiosidade de matriz africana, que se cultiva no Brasil. E ele diz que essas crenças africanas devem ser repudiadas porque se baseiam em personagens inexistentes. Ou seja, o pastor reivindica a verdade na historicidade do profeta nazareno que transformaram em um deus e rejeita o resto por historicamente falso.

Já não basta ao pastor a revelação, ele quer a história. E quer esmagar o que reputa serem mitos. Ele não disse, mas imagino que suas grandes provas da historicidade do nazareno sejam as de sempre. O livro de Flávio Josefo, evidentemente falsificado pelos cristãos primitivos, que interpolaram trechos sem pertinência com a história da guerra dos judeus. As cartas de Plínio, o Jovem, de Tácito e de Suetônio, que referem a existência da seita cristã, mas nada realmente sobre a figura do nazareno.

Forte nessas habituais referências – que talvez nem conheça realmente – o pastor diz que o culto de uma Iemanjá é desprezível, porque ela nunca existiu. Ele levou o problema simples de uma religião querer destruir outra para o campo da verdade fática de seus profetas, o louco! Esse é um risco da atomização das denominações reformadas, que não comportam uniformizações doutrinárias.

Ora, no campo da historicidade dos profetas e dos santos, todos são cegos sem guias. Nessa escuridão, ninguém se acha e todos se perdem. É melhor batalharem em outros sítios, invocar conversas diretas e particulares com os deuses, promessas, novas promessas, visitas do anjo, sinais, textos poéticos, textos desesperados, textos mal escritos. Tudo, enfim, que não meta a historicidade de alguém entre os argumentos.

Os favoritos do deus único não precisam da história. Quando acendem as fogueiras, não é para fazer história. Quando queimam as bibliotecas, não é para fazer história. De heresia, já basta acreditarem que sabem o que pode agradar a um deus, portanto não precisam aumentar o catálogo das impiedades invocando verdades humanas.

2 Comments

  1. Julinho da Adelaide

    Essa gente parece ter concluído que a melhor forma de ampliar e manter seus exercito de crentes é demonizar as outras religiões. Como trata-se de deus, o diabo anda sempre por perto para qualquer necessidade. E não falo apenas das variantes protestantes mas ate os catolaicos, antes de postura bem menos “aguerrida”, agora deram para isso. Outro dia fui a um enterro e após a “pregação” de um grupo protestante, pediu a palavra um catolico furioso a defender a virgem maria e a situação so seria mais ridícula se o morto levantasse para reclamar.

  2. Andrei Barros Correia

    Julinho,

    Está tudo se tornando muito parecido, realmente. Eu consigo antever um pouco do que deve acontecer, em breve. Para tanto, basta lembrar o que os católicos propuseram aos judeus, na península ibérica.

    O sujeito tinha algumas belíssimas alternativas. Podia abjurar de sua religião e assumir a pejorativa condição de cristão-novo. Ou podia ser preso, destituído de todos os bens, torturado e morto!

    Por esses dias, estaremos diante de opções assim gloriosas.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *